domingo, 13 de março de 2016

Como acabar com a disparidade de salários entre homens e mulheres.

Quando o comediante Ricky Gervais brincou que recebia a mesma coisa para ser o apresentador do Golden Globes do que as atrizes Tina Fey e Amy Poehler – juntas – seu humor mordaz com certeza ressoou em vários locais de trabalho.
Mais de meio século depois de o presidente John F. Kennedy assinar a Lei da Igualdade de Remuneração, a diferença entre os salários de mulheres e homens ainda continua. As mulheres recebem 79 centavos de dólar para cada dólar que os homens ganham, de acordo com o Escritório do Censo.
Essa estatística é baseada nos salários médios de trabalhadores em tempo integral, não em homens e mulheres nas mesmas ocupações, mas outros dados mostram que a diferença acontece em uma grande variedade de empregos. Cirurgiãs ganham 71% do salário de seus colegas, enquanto preparadores de alimentos recebem 87%, segundo informações da economista de Harvard Claudia Goldin.
A desigualdade não pode ser totalmente explicada por nada que os economistas consigam medir – educação e experiência dos trabalhadores, os empregos que escolhem, a quantidade de horas que trabalham ou o tempo que tiram de folga. Sobram outros fatores difíceis de quantificar, como discriminação ou a percepção que as mulheres têm das escolhas disponíveis para elas.
Então, o que seria preciso para acabar com a diferença? Cientistas sociais e legisladores têm algumas ideias, assim como as empresas que vêm tentando combater o problema entre seus funcionários.
Publicar o pagamento de todos. Quando os empregadores publicam os salários das pessoas, a disparidade diminui.
Jake Rosenfeld, sociólogo da Universidade de Washington, descobriu que a transparência salarial aumenta os pagamentos, em parte por dar legitimidade para os argumentos dos funcionários em negociações de salários. “Até mesmo reconhecer que a disparidade de gênero é uma questão pode mudar as regras”, afirma ele.
Isso aconteceu no setor público, onde há uma exigência da revelação de informação sobre pagamentos. Alexandre Mas, economista de Princeton, estudou os efeitos de uma lei californiana de 2010 que exigiu que as cidades publicassem salários municipais. Ela gerou cortes nos pagamentos, mas só nos dos homens.
As mulheres podem ter sido incentivadas a negociar depois de perceber que seus salários eram menores, teoriza ele, ou as cidades podem ter deixados os salários mais justos para evitar processos.
Alguns países europeus exigiram que grandes empresas publicassem informações sobre salários por sexo. Em 2014, o Presidente Barack Obama tornou obrigatório que os contratantes federais relatassem os valores ao Departamento de Trabalho. Outras empresas americanas dizem que analisaram os salários, mas a maioria de maneira privada.
No ano passado, Marc Benioff, o CEO da Salesforce.com, disse que depois dessa avaliação, a empresa gastou US$3 milhões para deixar os salários das mulheres iguais aos dos homens. A Kimberly-Clark e a PricewaterhouseCoopers afirmaram que suas análises levaram os gerentes a prestar atenção ao fato de que menos mulheres estavam atingindo posições importantes na empresa.
Negociar, ou não. Os homens ganham mais porque é muito mais provável que peçam mais.
Quando recebem ofertas de trabalho, 51,5 por cento dos homens e 12,5 por cento das mulheres pediram salários maiores, segundo um estudo de alunos pós-graduados da Universidade Canergie Mellon feito pela economista Linda Babcock. Em outra pesquisa, ela descobriu que, quando as mulheres negociam, pedem 30 por cento menos do que os homens.
Como o salário inicial determina os aumentos e pagamentos futuros, as mulheres que não negociam perdem ao longo de suas carreiras até US$750 mil, para empregos com salários médios, e US$2 milhões, para os com pagamentos altos, descobriu Linda.
Mas sua pesquisa e as de outras pessoas revelaram que as mulheres são penalizadas pela negociação, enquanto os homens são premiados. (Como escreveu a atriz Jennifer Lawrence na newsletter Lenny, depois da revelação de correspondência da Sony, dizendo que recebia menos do que seus colegas homens e não brigava mais porque “Eu não queria parecer ‘difícil’ ou ‘mimada'”.)
Uma solução, diz Linda, é ensinar as mulheres a negociar. Outra é desafiar as práticas corporativas para que as pessoas que determinam as compensações estejam conscientes da disparidade e defendam as mulheres durante as negociações.
Outra resposta é banir a negociação de salários completamente. Ellen Pao, quando foi executiva chefe do Reddit, adotou essa prática. A empresa estabeleceu níveis de salários baseados em cargos e experiência e ofereceu aos interessados valores não negociáveis.
“Deixamos para a empresa o ônus de pagar de maneira justa ao invés de exigir que o candidato negociasse o salário que achava certo”, escreveu Ellen Pao no The Hollywood Reporter.
Não se basear em salários anteriores. Se as mulheres podem perder milhões ao longo de suas carreiras porque recebem ofertas de trabalho baseadas em um salário que já é baixo, uma maneira de terminar com esse padrão é ignorar seus pagamentos anteriores.
O Google afirma fazer isso e oferece salários baseados no que o cargo vale.
Em agosto, o Escritório de Administração de Pessoal disse que os gerentes de contratação do governo não poderiam mais levar em conta os salários anteriores dos trabalhadores quando estivessem estabelecendo seu novo pagamento. A diretora interina, Beth Cobert, explicou que a prática era ruim principalmente para as mulheres que se afastaram por um tempo para criar os filhos. Também é mais provável que as mulheres tenham trabalhado em setores públicos com pagamentos baixos e que não visam lucro.
“Não pergunte o histórico de salário para novos contratados, isso realmente reduz o impacto de discriminações anteriores. Acho que é a coisa mais efetiva que as organizações podem fazer”, afirma Linda.
Torne o trabalho mais fácil para as mulheres. As pesquisas mostram que os primeiros salários de homens e mulheres logo que saem da faculdade são muito parecidos. A disparidade de salários por gênero aumenta alguns anos depois, quando as mulheres começam a ter filhos.
Algumas vezes seu pagamento fica menor porque elas saem um tempo do emprego quando seus filhos são pequenos, trabalham menos horas ou tiram mais folgas do que os homens para resolver problemas das crianças. Algumas vezes seus empregadores assumem que elas farão isso, mesmo quando não é verdade.
Leis que ajudam a manter as mulheres na força de trabalho, como creches baratas, licença remunerada em caso de doença e licença-maternidade, poderiam ajudar. Nos estados que oferecem licença-maternidade remunerada, por exemplo, existe mais possibilidade de as mães voltarem ao emprego, trabalharem mais horas e ganharem mais, segundo economistas.
“Se uma operadora de caixa fica grávida, não tem licença-maternidade, precisa sair do emprego e se reinscrever depois para o mesmo cargo, isso não é o mesmo do que fazer uma opção de carreira. Uma coisa que a lei pode fazer é tornar mais fácil para as mulheres permanecerem em suas carreiras”, afirma Philip Cohen, sociólogo da Universidade de Maryland.
Tornar os locais de trabalho mais flexíveis. Claudia Goldin, de Harvard, descobriu que a disparidade salarial é maior em ocupações que têm menos flexibilidade em termos de onde e quando as pessoas trabalham, como os setores de finanças e na medicina. A diferença diminui quando as pessoas podem trabalhar em seus próprios horários, como acontece com muitos empregos de tecnologia e naqueles em que as pessoas têm condições de ser facilmente substituídas por outras, como acontece com os farmacêuticos. Desse modo, as mulheres não sofrem tantas penalizações por trabalharem por menos horas.
As empresas devem se questionar sobre a cultura da necessidade de estar presente e de se trabalhar além do horário, e mudar a maneira como operam. Em uma farmácia, por exemplo, registros médicos eletrônicos possibilitaram que farmacêuticos diferentes atendam o mesmo paciente.
Mudar a lei. As leis federais não exigem a maioria dessas coisas, assim alguns legisladores estão tentando outras táticas.
A lei mais forte de igualdade salarial nos Estados Unidos entrou em efeito na Califórnia em janeiro. Diz que homens e mulheres precisam ganhar o mesmo salário para empregos parecidos, não apenas para exatamente o mesmo cargo no mesmo lugar, como exige a Lei de Igualdade de Remuneração, que é mais flexível. A lei californiana também proíbe os empregadores de retaliar contra trabalhadores que discutem o pagamento.
Uma lei federal proposta, conhecida como Ato de Justiça Salarial, exigiria que as empresas relatassem os dados de pagamentos para o governo, daria subsídios para treinamentos em negociação e tornaria processos de classe mais fáceis -, mas ela está parada no Congresso.

Fonte: O Estado de São Paulo / The New York Time, por Claire Cain Miller, 06.03.2016

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