sexta-feira, 28 de abril de 2017

TST não admite reclamação contra decisões contrárias a súmulas.

O Órgão Especial do Tribunal Superior do Trabalho (TST) não tem admitido reclamações contra decisões que não seguiram súmula ou orientação jurisprudencial. Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (CPC), advogados trabalhistas tentam argumentar que a jurisprudência deveria ser adotada pelas demais instâncias e decisões contrárias reformadas diretamente no TST, sem que tenham que seguir todo o percurso previsto para os recursos.
Os pedidos têm sido fundamentados no inciso V do artigo 927 do CPC. O dispositivo estabelece que “os juízes e os tribunais observarão a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”. E também no inciso I e II do artigo 988, que dispõe que caberá reclamação da parte interessada para preservar a competência do tribunal e garantir a autoridade das decisões.
De acordo com o advogado Daniel Chiode, do Mattos Engelberg Advogados, que entrou com algumas reclamações, os próprios ministros admitiram que esses dispositivos do CPC devem ser utilizados na Justiça do Trabalho nas Instruções Normativas nº s 39 e 40, de 2016, do Tribunal Superior do Trabalho.
Chiode ainda alega que o ministro Alexandre Agra Belmonte afirma em vídeo-aulas no YouTube, disponibilizadas pelo TST e pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat), que o descumprimento de súmula, orientação jurisprudencial, precedente ou decisão plenária de pacificação do tema pelo TST geraria reclamação.
“Além disso, com o novo CPC, o Supremo Tribunal Federal passou a admitir essas reclamações em caso de descumprimento de jurisprudência, o que não está sendo reconhecido nas decisões do TST”, diz Chiode.
As reclamações têm sido rejeitadas por unanimidade. Para os ministros, o recurso seria cabível apenas para decisões em incidente de resolução de demandas repetitivas e em incidente de assunção de competência (que envolve relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos). Ou ainda quando há desrespeito à decisão em outro processo do qual o reclamante figurou como parte.
Em um dos casos analisados, o relator, ministro João Oreste Dalazen, deixa claro na decisão que súmulas e orientações jurisprudenciais do Tribunal Superior do Trabalho não ostentam eficácia coercitiva, sendo tão-somente persuasivas”. O processo tratava de uma ação de reintegração de emprego.
O advogado Daniel Chiode, que assessora a companhia, argumentou que o tribunal de origem não aplicou ao caso a Orientação Jurisprudencial nº 137, editada pela Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-II) do TST.
A orientação diz que “constitui direito líquido e certo do empregador a suspensão do empregado, ainda que detentor de estabilidade sindical, até a decisão final do inquérito em que se apure a falta grave a ele imputada, na forma do artigo 494, ‘caput’ e parágrafo único, da CLT”.
O Órgão Especial também negou a admissão de reclamação em um outro caso semelhante, que tratava de reintegração de outro funcionário e a não aplicação pelo Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (Maranhão) da Orientação Jurisprudencial nº 137 da (SBDI II) do TST.
Segundo a relatora, ministra Kátia Magalhães Arruda, “efetivamente, a alegada não observância da Orientação Jurisprudencial 137 da SBDI-2 do TST não traduz invasão na competência ou desrespeito a decisão deste tribunal superior, nos termos da lei adjetiva (artigo 988 do CPC de 2015)”
Na decisão, acrescenta que no STF prevalece o entendimento de que “a reclamação não é admitida como sucedâneo recursal”. Assim, de acordo com a ministra “cabe ao interessado impugnar, por intermédio da via recursal própria, os atos que entende incompatíveis com a ordem jurídica”.
A Subeção II da Seção Especializada em Dissídios Individuais também rejeitou a tese em um caso envolvendo essa mesma orientação jurisprudencial pelos mesmos motivos.
De acordo com a decisão do relator, ministro Barros Levenhagen “as orientações jurisprudenciais das Subseções I e II de Dissídios Individuais tanto quanto as súmulas desta Corte apenas evidenciam o entendimento reiterado deste tribunal superior, formado por meio do exame de situações pretéritas e semelhantes, não se enquadrando, portanto, no conceito de decisão, prevista no inciso II do artigo 988 do CPC, a ensejar sua observância obrigatória, sobretudo por não serem dotadas de efeito vinculante”.
Para a advogada e professora da FGV-Rio e PUC-Rio Juliana Bracks, do Bracks Advogados Associados, o novo CPC pode dar margem para a interpretação de que caberiam essas reclamações diretamente ao TST, já que essas súmulas e orientações jurisprudenciais representam entendimento consolidado da Corte. “Porém, como efeito prático, isso poderia sobrecarregar ainda mais a instância superior.”
Para a advogada, com a não admissão de uma reclamação pelo TST, porém, o prejuízo seria apenas a demora para julgar a ação, que deverá percorrer todas as instâncias, caso não se aplique o entendimento consolidado pela tribunal superior. ” Acho um desrespeito à autoridade do TST, os juízes de instâncias inferiores ignorarem uma súmula. Seria mais efetivo coibir que magistrados julgassem de forma contrária”, diz.

Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar, 18.04.2017

quinta-feira, 27 de abril de 2017

Reforma trabalhista: retrocesso em 20 pontos.

O Projeto de Lei nº 6.787, de 2016, identificado como aquele que dispõe “sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências” tem por finalidade, não só regulamentar a eleição dos Representantes dos Trabalhadores nas empresas e alterar a Lei 6.019, de 3 de janeiro de 1974, mas também modificar, significativamente, inúmeros dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Em 12 de abril de 2017, a Comissão Especial emitiu Parecer, de Relatoria do Deputado Rogério Marinho (PSBD/RN), pela constitucionalidade, juridicidade e técnica legislativa do referido Projeto e apresentou o Projeto Substitutivo.
A soma do PL mais Substitutivo representa, em seu conjunto, um grande retrocesso na legislação trabalhista, pois os benefícios pontuais contidos em um ou outro artigo não escondem o caráter liberal do texto apresentado. Após votação polêmica que garantiu à proposta caráter de urgência – o que elimina a possibilidade de alterações ou emendas na comissão especial criada para este fim – o PL deve seguir nos próximos dias para votação no plenário da Câmara na qual se exigirá para aprovação apenas maioria simples.
Diante da importância da questão, faz-se necessário alguns apontamentos relacionados às propostas de alterações da CLT, alvo de verdadeira sangria nos direitos dos trabalhadores relacionados a seguir:
1- Grupo Econômico – Para o empregado urbano não mais será aplicado o § 2º do art. 3º da Lei nº 5.889, de 29 de junho de 1973 (Lei do Trabalhador Rural), que reconhece a existência de grupo econômico entre empresas que mantenham relação de coordenação entre si. Para esses trabalhadores, só haverá reconhecimento de grupo econômico quando, entre as empresas, houver típica relação de hierarquia. A proposta cria tratamento diferenciado entre o empregado urbano e o rural, sem que apresente qualquer razão justificante para isso, indo de encontro ao caput do art. 7º, da Constituição Federal.
O Projeto propõe, ainda, que a mera identidade de sócios não caracteriza grupo econômico, havendo necessidade de comprovar o efetivo controle de uma empresa sobre as demais.
2- Vínculo Empregatício – O texto insere um parágrafo no art. 3º, da CLT, para estabelecer que não será reconhecido vínculo empregatício, nem responsabilidade solidária ou subsidiária, no negócio jurídico entre empregadores da mesma cadeia produtiva, ainda que em regime de exclusividade.
Se as atividades das empresas estão inseridas dentro de uma mesma cadeia produtiva, e uma presta serviços exclusivos a outra, evidente que se trata de descentralização das atividades da tomadora e de típica hipótese de terceirização. A prevalecer a alteração legislativa, haverá sérios empecilhos na responsabilização das grandes indústrias, como por exemplo, as do ramo têxtil, que se beneficiam dos serviços de trabalhadores submetidos a condições análogas às de escravo, contratados por empresas inseridas na cadeia produtiva da confecção de vestuário.
3- Sócio Retirante – O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas, do período em que foi sócio, somente se a ação foi ajuizada dentro de 2 (dois) anos, a contar da averbação de sua retirada do contrato social.
A limitação da responsabilidade, da forma como colocada, será um entrave para a satisfação do crédito trabalhista, máxime em relação às empresas, que já em dificuldades financeiras, trocam os sócios por “laranjas”, tão somente para salvaguardar o patrimônio daqueles. O Projeto permite que aquele que de fato foi responsável pela má-administração da empresa fique isento de responsabilidade perante os créditos trabalhistas.
4- Banco de Horas e Acordo de Compensação – O texto insere o parágrafo 5º, no art. 59, da CLT, o qual dispõe que o banco de horas poderá ser pactuado, por acordo individual escrito, desde que compensado em seis meses. Permite também, no art. 59-A, o ajuste de “quaisquer formas de compensação”, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, desde que respeitado o limite diário de dez horas e compensado no mesmo mês.
A princípio, parece haver contradição entre o parágrafo 5º, do art. 59 e o art. 59-A, no que se refere ao período de compensação das horas extras, firmada por meio de acordo individual, já que o parágrafo 5º fala no prazo de seis meses, enquanto o art. 59-A fala no “mesmo mês”.
No entanto, o Relator do Projeto, ao comentar as alterações inseridas no art. 59-A, da CLT, afirma que o artigo trata de “outras formas de compensação”, o que leva ao entendimento de que o dispositivo não se refere a horas extras inseridas no banco de horas, mas um ajuste de compensação mensal de horas extras.
O art. 59-C, também inserido pelo Projeto, dispõe que “O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada, inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional”, repetindo, assim, o item III, da Súmula 85, do Tribunal Superior do Trabalho.
No entanto, contrariando o item IV, da Súmula 85, do TST, o parágrafo único do art. 59-C, dispõe que “A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada, nem o banco de horas”. A determinação do texto não se sustenta. Imaginemos um acordo de compensação para o dia de sábado, em que fique ajustado que o empregado trabalhará de segunda a quinta, das 8h às 18h, e às sextas, das 8h às 17h, sempre com uma hora de intervalo, totalizando 44 horas semanais. Na realidade, porém, o empregado passa a trabalhar de segunda a sábado, das 8h às 18h, inexistindo, portanto, a compensação ajustada. Evidente que o acordo de compensação não era praticado ou observado, restando descaracterizado porque não houve respeito ao dia de descanso ajustado, qual seja, o sábado. Assim, o empregado faz jus ao pagamento da hora mais o adicional extraordinário, conforme determinada o art. 7º, XVI, da Constituição Federal.
O Projeto prevê maior flexibilização no ajuste da jornada de trabalho, o que, em algumas hipóteses, pode vir a ferir a saúde dos trabalhadores, pois a exigência de uma jornada extensa, com compensações em período superior a semanal ou quinzenal, aumentará os riscos de acidentes de trabalho, e, consequentemente, maiores riscos à integridade física do trabalhador.
5- Teletrabalho – O Projeto exclui do Capítulo “Da Duração do Trabalho” os empregados em regime de teletrabalho. No entanto, é importante pontuar que o fato de o empregado estar trabalhando em regime de teletrabalho não significa que o empregador não possa controlar a jornada de trabalho daquele. Da forma como proposta a regulamentação do teletrabalho, a empresa poderá transferir ao empregado o custo da manutenção do seu local de trabalho (energia elétrica, mobiliário, equipamentos eletrônicos da residência do trabalhador) e, ainda assim, manter de certa forma o controle de sua jornada de trabalho, inclusive exigindo o comparecimento ao estabelecimento empresarial, sem que tal fato desconfigure o instituto ou garanta ao empregado o recebimento de horas extras, bastando, para tanto, que o labor preponderante continue fora das dependências do empregador.
6- Jornada 12×36 – No art. 59-B, da CLT, o texto prevê a possibilidade de realização de jornada 12×36, com o intervalo intrajornada, gozado ou indenizado. O parágrafo único, do mesmo artigo, refere que a remuneração do trabalhador já inclui o Descanso Semanal Remunerado (DSR), inclusive em feriado, e as prorrogações do período noturno.
Muita perda terá o trabalhador que cumpre a jornada 12×36, a qual é tida como uma exceção ao limite de 10 horas diárias de trabalho, previsto no parágrafo segundo do art. 59, da CLT. Isso porque o texto institui uma remuneração de natureza complessiva, pois engloba nesta as prorrogações do período noturno e o feriado. Isto fere o art. 7º, caput e inciso IX, da CF, pois, sem qualquer justificativa plausível, retira do trabalhador que cumpre a jornada 12X36, no período noturno, o direito de remuneração superior a do período diurno.
O DSR já faz parte da remuneração, pois o salário do empregado geralmente é mensal. No entanto, o Projeto olvida que o empregador pode remunerar o empregado por hora, e, neste caso, terá que pagar o DSR de forma apartada, sob pena de ferir o art. 7º, XV, da CF. Já em relação ao domingo, este já era considerado como compensado pelo descanso de 36 horas, no entanto, o texto passou a considerar também os feriados como compensados.
7- Dano extrapatrimonial – O Projeto limita o valor da indenização, pelo dano extrapatrimonial (moral ou existencial), a no mínimo 5 e no máximo 50 salários contratuais. Para a ofensa de natureza leve, estipula o valor de até cinco vezes o último salário contratual; para a ofensa de natureza média, estipula o valor de até dez vezes o último salário, e, para as de natureza grave, o valor de até cinquenta vezes o último salário contratual.
Ocorre que ao tabelar valores para indenização por danos morais, o Projeto fere princípio da igualdade material, que reza que devemos “tratar os iguais de forma igual e os desiguais de maneira desigual, na medida de suas desigualdades”.
É preciso dar destaque, ainda, que a regulamentação de uma tabela exclusiva para aplicação às relações de trabalho para arbitramento de indenização por dano extrapatrimonial trará limitação a condenações trabalhistas, enquanto em outras relações (comerciais, familiares ou do consumidor) permanecerão sem qualquer teto para a sua fixação.
Por fim, não se pode perder de vista que o Projeto aborda tratamento distinto para fixação do teto da indenização para o empregado e para o empregador. Isso porque no parágrafo primeiro, do art. 223-G, prevê a indenização em benefício do trabalhador com base no valor do salário por ele recebido. No parágrafo segundo, do art. 223-G, no entanto, prevê que possível indenização paga pelo trabalhador ao empregador também terá como base o salário daquele, conforme os parâmetros já declinados.
Ora, é premissa basilar para fixação de qualquer indenização a observância da condição econômica das partes, o grau de culpa, a repercussão da ofensa, o caráter pedagógico, punitivo e compensativo do ressarcimento.
O Projeto, de forma evidente, deixa de determinar a verificação da condição econômica da empresa e do empregado para a fixação da indenização e deixa de pensar, ademais, no caráter pedagógico da indenização, pois, muitas vezes, a fixação de baixas indenizações leva as grandes empresas a cometerem faltas reiteradas, não solucionando a questão no ambiente de trabalho.
8- Gestante ou lactante – Permite o trabalho da empregada gestante ou lactante em ambiente insalubre, mediante apresentação de atestado médico. Opta-se por expor a mulher e seu filho ao ambiente insalubre em prol da atividade econômica.
9- Contrato de trabalho intermitente – O Projeto institui no parágrafo terceiro do art. 443, da CLT, o contrato de trabalho intermitente, conceituado como aquele “no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, inclusive as disciplinadas por legislação específica”.
Com três dias de antecedência, o empregado é convocado para trabalhar, momento em que é informado da jornada a ser cumprida. O empregado pode aceitar ou não a convocação. O pagamento é realizado conforme o trabalho realizado, observando os períodos de prestação de serviços, que podem ser em horas, dias ou meses. O período de inatividade não é considerado tempo à disposição.
Vê-se da justificativa inserida no Projeto que a matéria fora regulamentada para permitir a adaptação do contrato de trabalho às relações contemporâneas, pretendendo-se diminuir o número de desempregados ou trabalhadores informais.
A regulamentação traz grande preocupação aos juristas mais atentos, pois poderá incentivar a adoção dessa modalidade de prestação de serviços, com pagamento de salário proporcional ao período trabalhado, no lugar do contrato de trabalho a prazo determinado ou indeterminado, não representando propriamente uma alternativa ao desemprego ou informalidade já existentes.
O parágrafo quarto do art. 452-A da CLT possibilitará ainda ao empregador convocar o empregado para trabalhar e desistir da execução do serviço sem justo motivo, pagando-lhe apenas 50% da remuneração que seria devida, ou seja, possibilitando o pagamento de valor inferior ao salário mínimo proporcional. Sem falar que haverá insegurança jurídica e grande discussão sobre o que seria considerado como “justo motivo” para recusa do serviço, sem pagamento do percentual de 50%, estipulado pelo Projeto como “multa”.
10- Empregado com nível superior – O Projeto insere o parágrafo único ao artigo 444, da CLT, o qual prevê a livre estipulação dos termos contratuais, para o empregado graduado e com salário superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios da Previdência Social. O empregado pode, ainda, acordar com o empregador as mesmas matérias negociadas pelos Sindicatos, em Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo (art. 611-A).
O Projeto trata o empregado, que recebe salário superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios da Previdência Social, como “alto empregado”.
Pelos valores atuais, o empregado que recebe o valor superior a R$11.052,62 é considerado, pelo Projeto, como plenamente capacitado para negociar as cláusulas de seu contrato de trabalho. No entanto, o fato de receber referido salário e de ser graduado não significa dizer que o empregado esteja em pé de igualdade com o empregador.
A empresa é estruturada para as negociações, pois além da área de Recursos Humanos, possui advogados contratados para prestarem consultorias. O trabalhador, por sua vez, não tem a mesma estrutura da empresa, nem contratará advogados para orientá-lo na elaboração dos termos contratuais, até porque, no mais das vezes, encontra-se desempregado e sem recursos para tanto no momento da admissão. Ademais, vale pontuar que um empregado que recebe o salário bruto de R$11.052,62 tem desconto de 11% de contribuição previdenciária (R$1.215,78) e depois de 27,5% de imposto de renda (R$2.705,13), sobrando-lhe, líquido, o valor de R$7.131,71.
11- Cláusula compromissória de arbitragem – O Projeto prevê, ainda, no art. 507-A, que “nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem, desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos termos previstos na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996”.
Para a instituição de cláusula compromissória de arbitragem, diferentemente do previsto no parágrafo único do art. 444, o Projeto prevê que basta que o empregado perceba remuneração superior a duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Não é exigido, aqui, que o empregado tenha nível superior. Além disso, diferentemente do artigo anterior citado, o dispositivo fala em remuneração e não salário, o que atrairá um maior número de trabalhadores que ficarão submetidos à arbitragem. Pelos mesmos motivos supra, entendemos que o empregado estará em situação de fragilidade frente à empresa.
Ademais, o art. 1º, da Lei 9.307/96 permite a arbitragem apenas em relação aos direitos patrimoniais disponíveis, hipótese que não se ajusta à indisponibilidade dos direitos trabalhistas, pois irrenunciáveis.
Por fim, apenas em sede de dissídio coletivo há a permissão constitucional, para submissão de conflitos trabalhistas à arbitragem (art. 114, §1º, da CF). No âmbito individual, a situação de hipossuficiência do empregado em face do empregador não autoriza a utilização da arbitragem, pois nítida a desigualdade entre as partes, ao contrário do que ocorre nos conflitos de natureza coletiva, quando o trabalhador, representado pelo sindicato profissional, está em pé de igualdade com o empregador.
12- Homologação de rescisão – O Projeto revoga os parágrafos primeiro e terceiro do art. 477, da CLT, e retira a necessidade de homologação do TRCT (Termo de Rescisão do Contrato de Trabalho) pelo Sindicato ou pelo Ministério do Trabalho. No prazo de dez dias, a contar do término do contrato de trabalho, a empresa deverá pagar as verbas e entregar as guias para saque do FGTS e do seguro-desemprego, sob pena de pagar multa no valor do salário do empregado.
A intenção do Projeto é a de que seja reconhecida a validade do termo de quitação das verbas trabalhistas e do pedido de demissão, mesmo sem a homologação sindical, o que é exigido pelo texto atual da CLT. Sob a justificativa de segurança do empregador, o Projeto retira a assistência sindical gratuita prestada ao trabalhador, no momento da rescisão, sendo a alteração nitidamente prejudicial, já que o trabalhador não terá condições financeiras para contratar um advogado. E ainda assim, caso contrate para pagar após o recebimento da rescisão, terá que ceder parte dos valores rescisórios, sendo outro retrocesso se comparado com a atual norma.
13- Dispensa Coletiva – O Projeto insere o art. 477-A, na CLT, para autorizar a dispensa coletiva, independentemente da intervenção sindical. Causa estranheza que um Projeto, que prima pela valorização da atuação sindical, dispense a intervenção do ente coletivo, justamente no momento em que este poderá ajudar na busca de soluções para minimizar o impacto das demissões em massa na economia e na sociedade. O texto é contrário aos valores sociais do trabalho e à livre iniciativa (art. 1º. III e IV, da CF), à função social da propriedade e a busca do pleno emprego (art. 170, III, e VIII, da CF).
14- Demissão Voluntária Individual – O Projeto insere o art. 477-B, na CLT, para fazer constar que a adesão ao Plano de Demissão Voluntária dá quitação plena e irrevogável aos direitos decorrentes da relação empregatícia. Incluiu ainda a possibilidade de um plano de demissão voluntária individual, o que pode dar ensejo a fraudes contra o trabalhador, pois o PDV, em sua essência, é formulado de maneira impessoal.
15- Distrato de Comum Acordo – O texto institui a possibilidade de extinção do contrato de comum acordo entre as partes. Quando isso ocorrer, o aviso prévio e multa de 40% serão pagos pela metade e as demais verbas pagas de forma integral. Libera-se 80% do FGTS, mas o seguro-desemprego não será liberado. A proposta do Projeto cria outra hipótese de ruptura do contrato. Porém, há de ser discutida a inovação, pois pode dar causa a fraudes na ruptura contratual, com a diminuição do montante rescisório do empregador, especialmente por estar o empregado desassistido do ente sindical.
16- Termo de quitação anual – O texto institui o termo de quitação anual, a ser assinado perante o Sindicato, com eficácia liberatória das parcelas especificadas. Outra inovação que há de ser debatida com bastante cuidado, já que posta de maneira a superar, por via oblíqua, o princípio da irrenunciabilidade de direitos trabalhistas. Explicamos. Passada a quitação anual com eficácia liberatória, caso não represente a realidade fática vivenciada, ou seja, caso não tenha recebido a parcela ali discriminada, o trabalhador terá grande empecilho para discutir judicialmente tal obrigação trabalhista, o que representaria o mesmo que renunciasse à parcela em questão.
17- Normas coletivas – Insere o art. 611-A na CLT, que dispõe sobre a prevalência do acordado sobre o legislado nas seguintes matérias: “jornada de trabalho; banco de horas individual; intervalo intrajornada; respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas; adesão ao Programa Seguro-Emprego; plano de cargos, salários e funções; regulamento empresarial; representante dos trabalhadores no local de trabalho; teletrabalho; regime de sobreaviso e trabalho intermitente; remuneração por produtividade; incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado; e remuneração por desempenho individual; modalidade de registro de jornada de trabalho, troca do dia de feriado; identificação dos cargos que demandam a fixação da cota de aprendiz; enquadramento do grau de insalubridade; prorrogação de jornada em ambientes insalubres, prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo; participação nos lucros ou resultados da empresa.”.
Prevê, ainda, que a inexistência de expressa de indicação de contrapartidas recíprocas, em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, não ensejará sua nulidade por não caracterizar um vício do negócio jurídico.
A prevalência do acordado sobre o legislado, seguida da ausência de contrapartida recíproca, é prejudicial ao trabalhador, que poderá ver suprimidos vários direitos, por norma coletiva. A contrapartida é inerente ao processo de negociação coletiva, em que há concessões recíprocas na elaboração da norma. Como proposto, o Projeto valida a concessão unilateral, com o único intuito de favorecer o empresariado.
O texto prevê, também, que os sindicatos deverão participar, como litisconsortes necessários, em ação individual ou coletiva, que tenha como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos.
A proposta prevê que as normas coletivas não podem suprimir direitos, elencando, basicamente os previstos nos incisos do art. 7º, da CF.
Veda, por fim, a ultratividade das normas coletivas, isto é, a permanência de sua vigência até que venha outra posterior revogando expressamente o benefício antes concedido.
18- Justiça Gratuita – Modifica o art. 790, §3º, da CLT, instituindo que a justiça gratuita será concedida, a requerimento ou de ofício, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 30% (trinta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Retira a possibilidade de o trabalhador declarar que não possui condições de pagar as custas do processo, sem prejuízo do próprio sustento. Além disso, determina que a parte comprove a insuficiência de recursos. A medida restringe o acesso do trabalhador à Justiça.
19- Contrato em regime de tempo parcial – O Projeto fixa a jornada laboral do contrato em regime de tempo parcial em 30 horas semanais, ou, alternativamente, em 26 horas semanais, com a possibilidade de realização de 06 horas suplementares. É nítida a prejudicialidade da mudança, pois o texto da CLT limita a jornada semanal desse tipo de contrato a 25 horas semanais, além de proibir a realização de horas extras.
20- Terceirização – O Projeto altera o art. 4º-A da Lei 6.019 de 1974, incluído recentemente pela Lei nº 13.429 de 2017, para dispor que “Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à empresa prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução“.
O art. 4-A, incluído na Lei 6.019 de 1974, pela Lei nº 13.429 de 2017, dispõe que a “Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos.“.
O Projeto pretende deixar clara a autorização para a empresa terceirizar toda e qualquer atividade, inclusive a principal.
O texto é contrário ao entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula 331, do Tribunal Superior do Trabalho, que considera ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, salvo no caso de trabalho temporário, serviços de limpeza, vigilância e relacionados à atividade-meio.
A permissão para terceirização em quaisquer atividades de uma empresa é prejudicial ao trabalhador, pois pulveriza a categoria, diminuindo a união entre os trabalhadores e reduz os direitos trabalhistas. Além disso, coloca em xeque o que se entende por atividade empresarial.
Da forma como autorizada, podemos imaginar uma empresa lucrativa e saudável, sem nenhum trabalhador, e uma empresa terceirizada responsável por um grande passivo trabalhista.
Conclui-se, por todo o exposto, que o Projeto de Lei 6.787, de 2016, importa em significativas mudanças na vida do trabalhador, e, antes de ser aprovado, com a alegada urgência que se coloca, merece e deve ser amplamente discutido com a sociedade, não se esquecendo, por óbvio, que os trabalhadores fazem parte dela.
(*) Juliana Herek Valério é Juíza do Trabalho Substituta do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região (TRT-2).

Fonte: JOTA, por Juliana Herek Valério (*), 26.04.2017

Modernização trabalhista privilegia a liberdade de escolha.

A modernização das relações do trabalho é essencial porque no mundo moderno ninguém quer ser obrigado a nada. Sim. Se tem algo que cada vez é mais latente nessa geração de trabalhadores e empreendedores é o anseio por liberdade, por deter as rédeas da vida em todos os aspectos, inclusive no trabalho.
Não é por acaso que pesquisa recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em parceria com IBOPE, constatou que o brasileiro quer mais liberdade para negociar rotinas de trabalho flexíveis. Mais de 80% das pessoas relataram que gostariam de poder trabalhar de casa, enquanto 73% informou querer poder definir a própria jornada de trabalho.
Nesse sentido a legislação trabalhista atual está ultrapassada, a começar pelo engessamento na relação entre empregado e empregador digna do contexto no qual ela foi criada, em que eram necessárias regras rígidas para proteger os trabalhadores que vinham do campo para os grandes centros urbanos. Há que se respeitar esse contexto e valorizar as legislações criadas. Contudo aquela superproteção ao trabalhador, anteriormente necessária, atualmente atrapalha as relações laborais.
Um exemplo emblemático é o horário de almoço. Um empregado, por lei, deve ter entre uma e duas horas de almoço diariamente, para alimentação e repouso. Porém, se na empresa houver um refeitório e diariamente um empregado, que tem 1 hora de intervalo, levar 40 minutos para almoçar e descansar, ele não pode negociar com o seu empregador voltar ao seu posto de trabalho 20 minutos antes, para sair 20 minutos mais cedo. Seria essa uma escolha a ser feita pela lei ou pelo empregado, que conhece os seus hábitos de alimentação, a sua rotina familiar, o trânsito que enfrenta ao sair do trabalho?
Esse é um exemplo de engessamento da lei trabalhista que, defasada, faz com que todo o universo de trabalhadores tenha que se submeter a uma padronização muitas vezes em confronto com a realidade, com o perfil do mercado de trabalho atual e com os anseios dos próprios trabalhadores. É obvia a necessidade de se ter garantias mínimas, como é o tempo para almoçar e descansar, porém o tamanho desse intervalo é uma decisão que diz respeito a cada trabalhador e a cada empresa, a depender do seu porte, do local onde estão, da atividade exercida.
Quer outro paradoxo? Enquanto há empresas no Reino Unido que oferecem aos empregados escolherem quantos dias querem ficar de férias, nossa legislação brasileira proíbe o fracionamento desse período de descanso, que aqui é de 30 dias. Também não pode o trabalhador, por exemplo, fracionar suas férias, dividindo-as em períodos curtos, para juntá-los com feriados prolongados, para uma viagem com os filhos em períodos fora das férias escolares, fugindo de períodos de pico. E assim, quem quiser viajar, terá que se submeter às tarifas mais caras dos períodos considerados de alta temporada.
Esses são exemplos pontuais de barreiras que a legislação trabalhista cria, que impedem avanços do ambiente de negócios do País – pois as empresas perdem com a burocracia administrativa e com a falta de alternativas para a gestão das pessoas e do processo produtivo – e, por vezes, vão de encontro ao desejo do próprio trabalhador. E, com isso, a relação entre empresas e empregados vai ficando minada, pois o diálogo não ocorre a partir do entendimento dos anseios das duas partes, e sim em torno do que é possível fazer sem que se gere insegurança jurídica.
Por isso, modernizar a legislação trabalhista é essencial. Só assim haverá espaço para ajustar as relações de trabalho, tornando-as flexíveis em prol da possibilidade de gestão e definição pelos próprios empregados e empregadores das regulamentações de temas específicos a sua realidade de trabalho. Esse é o caminho para a busca de soluções negociadas.
É preciso afastar o mito de que “são os trabalhadores, mais uma vez, que têm que pagar a conta”. Se o Brasil hoje tem 13,5 milhões de desempregados e mais de 16 mil empresas que abriram falência só em 2016, quem paga a conta é toda a população, é todo o país. Ao invés de buscar culpados e injustiçados, precisamos, em benefício de todos, buscar soluções para reverter a crise, e, assim, atrair investimentos para que sejam retomados postos de trabalho, pois sem investimento não há empresas, e sem empresas não há empregos.
Nesse mesmo sentido, sindicatos de trabalhadores e sindicatos de empresas devem atuar, almejando realizar negociações que, longe de suprimir direitos, serão o melhor caminho para preservá-los por propiciarem condições justas e adequadas aos atores envolvidos.
Modernizar as relações de trabalho não é uma agenda momentânea, fruto da crise. É uma agenda de longa data, que poderia já ter sido enfrentada em tempos de bonança, mas infelizmente não foi. O cenário agora demanda soluções realistas, sem posições dogmáticas e rígidas, pois essas não mais se adequam ao mundo do trabalho moderno e dinâmico, em que é possível alguém do Brasil trabalhar, de sua casa, para uma empresa no Japão, por exemplo.
Cabe a nós brasileiros nos desvencilharmos da visão paternalista e protetora da legislação do trabalho e encarar a necessidade de transformar a legislação defasada em espaços de negociação favoráveis a um modelo sustentável de relações do trabalho que promova a proteção e o bem estar de toda a sociedade.
(*) Monica Messenberg é Diretora de Relações Institucionais da CNI.

Fonte: CNI, por Monica Messenberg (*), 26.04.2017

Mantido valor de indenização a empregada decorrente de assédio moral por racismo.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao agravo de instrumento de uma atendente de loja da Makro Atacadista S.A. em Santa Catarina que buscava o aumento do valor da indenização por dano moral, fixada em R$ 70 mil, decorrente de assédio moral por tratamento discriminatório de cunho racial. Para o relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, o montante atende o princípio da razoabilidade e o critério satisfativo-punitivo da compensação por dano moral.
A empregada contou que, alguns meses após sua contratação, passou a ser vítima de racismo praticado por outra empregada, que a levou, inclusive, a registrar ocorrência policial e a apresentar reclamação no canal de comunicação de atos ilegais no local de trabalho da Makro. A partir daí, porém, disse que a ofensora passou a provocá-la com empurrões e esbarrões, de forma proposital. Os fatos, segundo ela, foram levados ao conhecimento dos superiores, sem que se tomassem providências.
Condenada em primeira instância ao pagamento de R$ 500 mil de indenização por dano moral, a rede atacadista recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), que reconheceu a configuração do assédio moral e o tratamento discriminatório de cunho racial, mas reduziu a condenação para R$ 70 mil.
Ao examinar o agravo de instrumento da empregada para o TST, o ministro Walmir Oliveira da Costa explicou que o Tribunal somente revisa valor de indenização arbitrado a título de reparação de dano moral quando for exorbitante ou insignificante, em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se constata no caso. A decisão foi unânime.
( AIRR-709-13.2015.5.12.0014 )

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, por Mário Correia, 26.04.2017

Técnica de enfermagem vítima de assédio moral após retorno de licença maternidade será indenizada.

Uma técnica de enfermagem buscou indenização na Justiça do Trabalho, afirmando ter sido vítima constante de assédio moral praticado pela Secretária Municipal de Saúde da cidade de Estiva-MG e pela encarregada junto àquela secretaria. Segundo afirmou, essas pessoas a perseguiam na realização de seus serviços.
Ao examinar o caso, a juíza Andréa Marinho Moreira Teixeira, na titularidade da 3ª Vara do Trabalho de Pouso Alegre-MG, entendeu que a empregada tinha razão. A prova testemunhal a convenceu de que a trabalhadora era perseguida por seus superiores, recebendo tratamento diferenciado em relação aos demais funcionários. Conforme constatou, a trabalhadora era obrigada a apresentar relatório de produtividade, exigência essa que não era imposta às demais empregadas, além de ser mais destacada para deslocar-se para a zona rural do que as outras auxiliares de enfermagem e de ter recebido advertência por ter saído mais cedo para levar sua filha ao médico, mesmo com autorização de sua superior. Além disso, teve seu horário de trabalho alterado para o turno da tarde, apesar de morar em outra cidade e de não haver transporte público compatível com o novo horário. Tudo isso, sem que as outras empregadas que já moravam no município fossem consultadas para manifestar eventual interesse na mudança de turno.
A magistrada esclareceu que o assédio moral caracteriza-se como uma prática abusiva do poder diretivo ou disciplinar, atentando contra a dignidade e a integridade psíquica e física de uma pessoa e degradando o ambiente de trabalho, ou seja, é a exposição do trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. E a julgadora concluiu que, de fato, ficou comprovada a conduta abusiva praticada pela empregadora.
“Se a empregadora age de forma hostil e diferenciada em relação à empregada, dispensando-lhe tratamento diferenciado sem nenhuma justificativa, configura-se o assédio moral” , alertou a juíza, salientando que a empregadora deve garantir um ambiente de trabalho respeitoso aos trabalhadores, respondendo de forma objetiva pelos atos dolosos ou culposos praticados pelos seus empregados, serviçais e prepostos (artigo 932 do CC).
Assim, no entender da juíza, o Município deve responder pelos atos praticados contra a técnica de enfermagem, uma vez que a conduta adotada acarretou inegável sofrimento da trabalhadora, culminando, inclusive, com o seu pedido de demissão em meio à situação enfrentada. Considerando as circunstâncias do caso, a juíza condenou o Município a pagar a trabalhadora uma indenização arbitrada em R$5.000,00. Houve recurso dessa decisão, que foi confirmada pela 4ª Turma do TRT mineiro.
( 0011132-74.2015.5.03.0178 RO )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 26.04.2017

Estudos alertam que teletrabalho pode aumentar estresse e insônia.

À primeira vista, poder trabalhar de qualquer lugar por meio de dispositivos móveis como celular ou tablet, prática chamada de teletrabalho, traz muitas vantagens, como ganhar tempo, economizar dinheiro com transporte ou ter uma vida familiar mais equilibrada. Em grandes doses, porém, pode prejudicar a saúde, revelou um relatório da ONU.
O documento, feito em conjunto pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência das Nações Unidas, e a Eurofund, agência da União Europeia, se baseia em pesquisas realizadas em 15 países.
O relatório, divulgado em fevereiro, faz uma distinção entre as pessoas que trabalham em casa, que parecem desfrutar de um maior equilíbrio entre a vida profissional e a familiar, e os trabalhadores “muito móveis”, que utilizam novos meios de comunicação e estão mais expostos às consequências negativas sobre a sua saúde e bem-estar.
Vantagens e desvantagens
Entre as vantagens do teletrabalho, também conhecido como “home office”, os funcionários apontam a redução do tempo de deslocamento, uma maior autonomia e um maior equilíbrio entre a vida profissional e a privada.
As empresas veem nesta modalidade uma maior motivação dos funcionários, mais produtividade e eficiência, e acima de tudo, uma redução do espaço de escritório necessário.
Mas a outra faceta do teletrabalho é mais preocupante.
O relatório destaca “a tendência a induzir um prolongamento da jornada de trabalho, a criar uma sobreposição entre emprego e vida privada e a levar a uma intensificação do trabalho”.
O estudo acrescenta que “41% dos trabalhadores muito móveis apresentam altos níveis de estresse, em comparação com 25% dos que trabalham o tempo todo no escritório”.
Além disso, 42% das pessoas que trabalham em casa a tempo completo e 42% dos teletrabalhadores muito móveis dizem que acordam várias vezes durante à noite, enquanto isso só acontece com 29% dos funcionários que trabalham no escritório.
Jon Messenger, coautor do relatório, ressalta as vantagens do teletrabalho a tempo parcial, que permite manter o contato com os colegas.
“O equilíbrio ideal parece ser de dois a três dias de trabalho em casa”, disse Messenger em uma coletiva de imprensa em Genebra.
“Talvez as empresas devessem recorrer [ao teletrabalho] com mais frequência, visto que este tem efeitos positivos, não só para os funcionários, mas também para o empregador”, acrescentou.
O relatório também defende o “direito a desconectar”, citando o exemplo da França e da Alemanha. Algumas empresas já impõem que os servidores informáticos sejam desligados fora do horário de trabalho para impedir o envio de e-mails durante os períodos de descanso e férias.

Fonte: G1, 26.04.2017

A reforma trabalhista vai gerar empregos? Por que a questão divide especialistas.

Críticos da reforma acreditam que as mudanças propostas retiram direitos dos trabalhadores, o governo argumenta que a “modernização das leis vai gerar mais empregos” ao melhorar as condições de contratação para as empresas.

A tese divide estudiosos do tema. Opositores da reforma ressaltam que o principal gerador de emprego é o crescimento econômico, obtido com mais investimentos e aumento do consumo.
Já seus defensores consideram que mercados de trabalho com regras mais flexíveis permitem às empresas demitir menos em tempos de crise (por exemplo, ao reduzir jornadas e salários ou terceirizar funções) e a ter menos receio em contratar quando a economia dá sinais de melhora.
O advogado Mauro Menezes, autor do livro Constituição e Reforma Trabalhista no Brasil, diz que “não há evidência que a redução da qualidade dos empregos gera maior empregabilidade”.
“Em 1998, o governo Fernando Henrique fez uma minirreforma criando contrato por tempo determinado, banco de horas e jornada parcial e, após algum tempo, não houve qualquer estímulo ao mercado de trabalho”, afirmou.
“Já em 2014, com as regras que agora querem mudar, chegou-se a falar em pleno emprego. O que comprovadamente gera maior empregabilidade é a dinâmica da economia, os investimentos”, acrescentou.
Cinco milhões de novos postos?
O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, tem afirmado que a nova legislação proposta pelo governo, ao mudar as regras de contratos temporários e de jornada parcial, tem potencial para criar cinco milhões de empregos formais. Ele chegou ao valor ao comparar o uso desses contratos no Brasil (6% do total) com a média de países desenvolvidos (16% entre nações da OCDE) e projetar o potencial de crescimento desses tipos de vínculos empregatícios no país.
A ampliação da duração máxima do contrato temporário, de seis para nove meses, prevista na proposta de reforma enviada ao Congresso em dezembro, acabou já sendo aprovada dentro da nova lei da terceirização, de março deste ano. A extensão da duração máxima desse tipo de contratação se aplica a atividades sazonais, que não exigem contrato permanente, ou à substituição de trabalhadores em licença.
Já o contrato de jornada parcial, que hoje é limitado a 25 horas semanais sem possibilidade de horas extras, poderá ter dois novos formatos: duração máxima de 30 horas semanais sem horas extras ou 26 horas, mas com possibilidade de mais 6. O argumento é que a mudança dessas regras favorece a contratação formal de jovens, idosos e mães.
O professor do departamento de Direito de Cambridge Simon Deakin, especialista no impacto de leis trabalhistas sobre emprego e renda, disse à BBC Brasil não haver evidências de que essas mudanças nas formas de contrato criem empregos.
“Minha pesquisa mostra que, em geral, o afrouxamento dos controles sobre o trabalho temporário e em tempo parcial não leva à criação de emprego. Isso pode ter o efeito de reduzir o emprego na economia formal, porque estes postos de trabalhos ficam menos atraentes aos trabalhadores, que passam então a preferir atuar como autônomos ou no mercado informal”, afirmou, ressaltando não ter feito análises específicas sobre o mercado de trabalho brasileiro.
Segundo Deakin, o aumento do trabalho temporário e em tempo parcial reduz os estímulos para que as empresas invistam em qualificação, diminuindo a produtividade. Além disso, ressalta, leis menos rígidas sobre a duração dos contratos e tempo de trabalho também costumam piorar a distribuição de renda entre trabalhadores e empresas, com uma maior parcela da renda nacional concentrada em lucros e dividendos e uma parcela menor convertida em salários.
O relator da reforma na Câmara, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), incluiu ainda a previsão de mais um tipo de contrato que hoje não existe no Brasil: o trabalho intermitente, conhecido no exterior como “zero hora”. Nesse caso, o trabalhador é convocado sob demanda e recebe por hora trabalhada, não tendo garantia de uma jornada mínima.
“A expansão da variedade de contratos para incluir o ‘zero hora’ no Reino Unido tem tido impactos negativos diminuindo a renda do trabalhador, assim como na produtividade, o que é potencialmente ruim para a economia”, afirma Deakin.
Proteção demais pode atrapalhar contratação
Apesar de ver potencial negativo em algumas das mudanças em discussão no Congresso brasileiro, o professor de Cambridge ressalta que seria preciso um estudo amplo, envolvendo muitas variáveis econômicas, para avaliar realmente o impacto dessa reforma na geração de emprego no país.
“Os efeitos (das leis trabalhistas) podem ser ‘não lineares’, ou seja, proteger os trabalhadores até um certo ponto pode ser bom para a economia, mas além desse ponto pode ser negativo, desencorajando empregadores a contratar. Qual é exatamente este ponto difere de país para país”, afirma.
O Banco Mundial tem historicamente destacado esse risco de que uma legislação muito rígida pode, ao invés de proteger os trabalhadores, criar obstáculos para a geração de empregos.
“Esse não é um tema para ser tratado assim no abstrato, no geral”, afirma o diretor-executivo do banco Otaviano Canuto, destacando que muitas variáveis influem no nível de emprego.
“A flexibilidade do mercado de trabalho americano é enorme e não é por acaso que os Estados Unidos mostram uma capacidade maior de resposta de geração de emprego depois da crise do que vários europeus”, exemplifica.
Ele elogia um dos pontos centrais da reforma defendida pelo governo Temer: a previsão de que alguns parâmetros trabalhistas estabelecidos em lei possam ser negociados entre trabalhadores e empresários, como a duração da jornada de trabalho (que poderá chegar a 12h em um dia, sendo compensada com folgas nos seguintes), os planos de cargos e salário, a participação de lucros, entre outros.
Atualmente, muitos acordos entre trabalhadores e empregados têm sido anulados na Justiça do Trabalho, o que gera insegurança jurídica, segundo o governo. A reforma quer restringir a interferência do judiciário apenas a aspectos formais desses acordos, sem entrar na análise do seu equilíbrio.
Segundo Canuto, “é impossível criar emprego por lei, pois isso não obriga as empresas a contratar”. No entanto, diz ele, uma legislação mais flexível, que fortaleça as negociações entre trabalhadores e empresários, pode reduzir os receios das empresas em retomar as contratações quando a economia começar a melhorar.
“Uma legislação mais flexível vai permitir que a recuperação possa ter fôlego porque isso depende da geração de empregos. Ter uma legislação que joga contra a geração de empregos enfraquece a recuperação cíclica em qualquer economia de mercado no mundo”, argumenta.
“O timing da reforma é bom porque o país está, enfim, saindo de uma crise em breve e temos que potencializar a capacidade de contratação”, concorda a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif.
Ela ressalta porém o risco de “frustração” como os resultados no curto e médio prazo.
“Não é só a questão do mercado de trabalho que está torta, o mercado de crédito está fraco, há a dúvida de qual vai ser o próximo presidente e quão conectado ele vai estar com responsabilidade fiscal e reformas. Tem muita coisa que pode realmente atrapalhar o aumento do emprego”, diz. “Mas mesmo que no curto prazo (o impacto da reforma) possa frustrar, ela vai na direção certa”, diz.
O advogado Mauro Menezes, por sua vez, diz que a o fortalecimento das negociações entre trabalhadores e empresas é positivo desde que os sindicatos sejam fortalecidos, para garantir equilíbrio nos acordos. Para ele, a reforma em debate deixa os empregados vulneráveis e representa um “retrocesso”.
“Teria que ter primeiro uma reforma sindical que fortalecesse e habilitasse os sindicatos para resolver extrajudicialmente as questões e assim diminuir o número de causas trabalhistas. Isso seria muito saudável. Mas não se prevê qualquer medida de fortalecimento das entidades sindicais nessa reforma”, critica.
Fonte: BBC Brasil, 26.04.2017

Substitutivo dificulta e encarece acesso ao Judiciário.

A reforma trabalhista vai dificultar e encarecer o acesso à Justiça do Trabalho. Pelo texto apresentado, o trabalhador terá que pagar antecipadamente custas processuais se faltar em julgamento e entrar com nova demanda. Também correrá riscos de pagar honorários de sucumbência ao advogado da empresa e perícias solicitadas.
Pelo substitutivo apresentado pelo relator, deputado Rogério Marinho (PSDB­-RN), o trabalhador terá que pagar honorários de sucumbência sobre as verbas não concedidas ­ que variam entre 5% e 15% ­ e perícia que negar o pedido solicitado, como comprovação de doença profissional.
O presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, faz os cálculos dos prejuízos com o texto que poderá ir à votação hoje. De acordo com ele, se um trabalhador perder R$ 80 mil em verbas trabalhistas de uma ação no valor de R$ 100 mil, terá que pagar R$ 12 mil de honorários de sucumbência (15% do total). Ou seja, no final, ficaria apenas com R$ 8 mil dos R$ 20 mil obtidos, sem contar o eventual pagamento de perícia.
“Restará o que? O trabalhador não vai à Justiça para enriquecer. Vai para receber verbas trabalhistas. E pela proposta poderá perder dinheiro”, afirma o presidente da Anamatra, que espera mudanças com a votação hoje em plenário.
Outra mudança criticada pela Anamatra é a que estabelece o pagamento de custas antecipadas para novo processo do trabalhador, em caso de falta em julgamento e arquivamento de pedido anterior. Hoje, segundo especialistas, dificilmente um trabalhador não consegue justiça gratuita. “Fatos corriqueiros da vida real podem fazer um trabalhador faltar, como perder a condução ou não ter dinheiro para o deslocamento”, diz Siqueira.
Com a reforma, segundo o presidente, perde o trabalhador, a Justiça do Trabalho ­ com seus 3,6 mil magistrados distribuídos entre os 24 tribunais regionais ­ e a própria União, com a arrecadação de Imposto de Renda e contribuição previdenciária, que beirou R$ 3 bilhões em 2016.

Fonte: Valor Econômico, por Arthur Rosa, 26.04.2017

Oito súmulas do TST serão atingidas pelo projeto.

O texto do Projeto de Lei nº 6769/2016, que trata da reforma trabalhista, cancela de forma indireta oito súmulas do Tribunal Superior do Trabalho (TST) favoráveis aos trabalhadores. O projeto legaliza práticas hoje condenadas pelos ministros ou suprime indenizações previstas nessas normas que orientam os magistrados de primeiro e segundo grau.
As chamadas horas “in itinere” hoje devidas pelas empresas e prevista na Súmula 90 do TST deixam de existir pela proposta. Atualmente o tribunal considera que o tempo gasto pelo trabalhador da entrada da fábrica até o posto de trabalho devem ser acrescidos às horas trabalhadas. O mesmo vale para o tempo de deslocamento em condução fornecida pelo empregador, até o local de trabalho de difícil acesso, ou não servido por transporte público regular.
Outra súmula atingida é a 437. O projeto de lei autoriza o intervalo intrajornada para repouso e alimentação de até 30 minutos por meio de acordo coletivo. A súmula do TST veda que o período de uma hora de intervalo seja negociado. “Há estatísticas de que a maioria dos acidentes de trabalho ocorre durante a prorrogação da jornada. Com a redução para 30 minutos em uma jornada que pode chegar a 12 horas, a chance de a concentração do trabalhador diminuir é muito alta”, diz o advogado Wagner Luís Verquietini, do Bonilha Advogados.
Outra mudança é a possibilidade da jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, prevista no artigo 59-B do projeto, ser estabelecida mediante acordo individual e para qualquer setor. Hoje a Súmula 444 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) admite a utilização dessas jornadas mediante acordo em convenção coletiva.
” Isso é uma realidade em setores como o de saúde. Porém, com essa abertura da lei e ao permitir para todos e sem acordo coletivo, aumentará e muito o risco de acidente de trabalho e de doenças ocupacionais”, afirma o advogado José Eymard Loguercio.
A Súmula 372 do TST que prevê a incorporação ao salário de gratificação, após dez anos de pagamento, também será atingida caso o projeto seja aprovado. A proposta suspende essa possibilidade. Nesse sentido, se um gerente ganha uma remuneração extra em função do cargo, deixa de exercê-lo após dez anos na mesma empresa, por exemplo, ele não terá mais direito a incorporar esse pagamento à nova remuneração.

Fonte: Valor Econômico, por Zínia Baeta e Adriana Aguiar, 26.04.2017

Opinião – Reforma trabalhista não responde aos desafios do século 21.

Reagindo à greve geral convocada para esta sexta-feira (28) contra as reformas do governo Temer, o prefeito João Doria declarou que a “reforma da Previdência não afeta ninguém” e que a trabalhista muda uma “legislação arcaica que prejudica a todos”.
Segundo ele, a lei trabalhista atual “não protege o trabalhador. Ela prejudica, à medida que não gera mais empregos”.
Poucos temas na economia são mais controversos do que os efeitos da flexibilização de leis trabalhistas sobre a criação de postos de trabalho.
Os estudos existentes para sustentar a hipótese defendida por Doria carecem, no mínimo, de robustez estatística. A proliferação de estudos sugerindo o contrário —ou seja, que a desregulamentação do mercado de trabalho não eleva, ou até prejudica, o nível de emprego— parece ter levado a uma mudança de posição até mesmo de alguns organismos multilaterais que costumavam preconizar maior flexibilidade.
O relatório de 2003 do Banco Mundial “Economies Perform Better In Coordinated Labor Markets” concluiu, por exemplo, que, “ao nível macroeconômico, taxas maiores de sindicalização levam a uma menor desigualdade nos rendimentos e podem aumentar a performance econômica (na forma de taxas menores de desemprego e inflação e resposta mais rápida aos choques)”.
Mas o debate sobre o suposto dilema entre garantir direitos de trabalhadores e aumentar o dinamismo e a eficiência econômica ganhou complexidade com o advento das novas tecnologias de informação e comunicação e com a chamada “uberização” no mercado de trabalho.
Como apontam Jacques Barthélémy e Gilbert Cette no livro “Trabalhadores no Século 21”, trabalhadores independentes do ponto de vista jurídico também ficam frequentemente em situação de dependência econômica em relação às empresas prestadoras, que detêm o poder de fixação de preços, sanção e interrupção das relações de trabalho.
A greve de motoristas de Uber em dezembro de 2016 em Paris trouxe à tona esse desequilíbrio e jogou ainda mais luz em um desafio hoje global: como adaptar-se à criação dessas novas atividades sem desproteger e precarizar trabalhadores?
O caminho defendido por Barthélémy e Cette não é nem transformar todos os trabalhadores independentes em assalariados nem manter o status quo. O que os autores propõem é a garantia de direitos a todos os trabalhadores em estado de subordinação —assalariados ou não.
Para eles, um código amplo de novos “direitos da atividade profissional”, que não substitui os direitos dos trabalhadores assalariados, teria de preservar para o chamado “cidadão-trabalhador” o direito à saúde, à renda razoável e à aposentadoria digna, além de impedir a ruptura de contratos de um dia para o outro, por exemplo.
Construir uma agenda para a modernidade não significa, portanto, confundir trabalhadores autônomos em clara situação de dependência econômica com os empreendedores altamente qualificados da era da internet e do “home office”, que também proliferam em todo o mundo.
Em ambos os casos, “não ter patrão” pode até ser objeto de escolha —em um contexto de desemprego crescente e falta de oportunidades no mercado formal de trabalho, fica mais difícil dizer—, mas há graus distintos de subordinação.
No Brasil, a criação do status de MEI (microempreendedor individual) e a PEC das Domésticas, por exemplo, aprofundaram o debate sobre essa agenda, concordando-se ou não com o formato final das legislações.
Na reforma trabalhista, aprovada na Câmara nesta quarta (26), por sua vez, além da falta de debate com a sociedade, não há modernidade alguma. Afinal, não há nada de mais arcaico do que aumentar ainda mais o poder dos que já o têm de sobra.

Fonte: Folha de São Paulo, por Laura Carvalho, 27.04.2017

Sindicatos sérios e sindicatos pelegos.

Se for aprovada, a reforma trabalhista deve tornar inevitável a reforma sindical.
Inúmeras propostas nessa direção estão paradas no Congresso. A novidade que pode destravá-las é o novo tratamento a ser dado à contribuição sindical obrigatória, o imposto sindical. Pelo atual projeto ela pode ser extinta ou transformada em voluntária. O relator da reforma trabalhista, Rogério Marinho (PSDB-RN), avisa que o dispositivo separará sindicatos sérios dos sindicatos pelegos.
Em 2016, o imposto sindical rendeu R$ 3,6 bilhões. Corresponde ao desconto de um dia de salário por ano dos trabalhadores com registro na carteira de trabalho e, no caso dos sindicatos patronais, à cobrança de 0,02% a 0,8% do capital social das empresas.
O ex-ministro do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto adverte que a reforma trabalhista não será suficiente para separar o joio do trigo. Será preciso rever o estatuto da unicidade sindical.
Garantido pela Constituição, o princípio da unicidade sindical proíbe que, no mesmo município, haja mais de um sindicato por categoria profissional (no caso dos sindicatos laborais) ou por categoria econômica (dos sindicatos patronais). Exemplo: no Município de São Paulo só pode haver um sindicato dos bancários.
O princípio da unicidade foi admitido para evitar proliferação de sindicatos. Mas deu o contrário. A Alemanha, por exemplo, só tem 11 sindicatos e o Reino Unido tem 168. No Brasil, são 16,5 mil sindicatos registrados , número em crescimento porque o imposto sindical atrai aproveitadores cujo objetivo não é a defesa dos direitos do trabalhador, mas meter a mão no dinheiro.
A exigência da unicidade sindical é problema porque, uma vez estabelecido um sindicato fajuto, não pode ser criado outro no município. Restaria a hipótese de que outro grupo, identificado com os interesses do trabalhador, tomasse o poder. Na prática, isso é raro, porque as diretorias se perpetuam na direção. Em 2015, 8,5 mil dirigentes sindicais completaram mais de 10 anos nos cargos.
A Justiça do Trabalho está atolada em processos. Mas novas disputas sindicais aumentam essa carga. Dos 2,7 milhões de ações que chegaram às varas do Trabalho em 2016, cerca de 100 mil tratavam do funcionamento dos sindicatos. Dessas, 29 mil questionavam a aplicação do princípio da unicidade, representação, registro ou enquadramento por categoria.
O professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e da FGV Paulo Sérgio João observa que, além de ter de decidir qual sindicato tem poder de representação, a falta de transparência e as disputas têm levado juízes a fiscalizar negociações e acordos coletivos. Ou seja, “nem a Justiça do Trabalho confia nos sindicatos”.
De todo modo, o fim da contribuição sindical obrigatória não esgota o debate sobre a atuação dos sindicatos. Uma vez que passe a prevalecer o negociado sobre o legislado, como pretende a reforma trabalhista, terá ainda mais peso saber quem vai negociar por uma categoria: um sindicato oficial, porém pouco representativo, ou o que reúne mais filiados? Se a lei continuar a exigir que haja apenas um sindicato por base territorial, será difícil garantir que trabalhadores terão bons acordos e que ficarão mais estimulados a participar das negociações. “O sindicato tem que ser democrático e não pode depender do Estado”, diz Pazzianotto.

Fonte: O Estado de São Paulo, por Celso Ming e Raquel Brandão, 26.04.2017

Perder direitos ou usá-los melhor?

Um dos argumentos mais usados pelos setores que se opõem à reforma trabalhista é o de que o projeto de lei (PL) 6787/2016 retira direitos dos trabalhadores. O argumento é repetido à exaustão, mas nunca se aponta quais direitos estariam sendo retirados. Li e reli o PL e também a emenda elaborada pela Comissão Especial da Câmara, mas não encontrei nenhum artigo que elimina direitos.
Por que, então, a gritaria? Provavelmente porque a reforma subverte a hierarquia das fontes dos direitos trabalhistas. Até hoje, a lei era a fonte suprema, à qual se subordinava a negociação coletiva. A reforma muda o jogo e estabelece, em seu artigo 611-A, que “a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei”. Esse dispositivo tem sido considerado como uma ameaça aos trabalhadores, sob a alegação de que, sendo a parte mais fraca, os sindicatos não conseguirão resistir e os trabalhadores perderão direitos na mesa de negociação.
Embora pouco representativos e muito fragmentados, os sindicatos têm sido bem-sucedidos na negociação coletiva de salários e pisos, mesmo no período recessivo destes últimos anos. Os dados coletados pela Fipe no Projeto Salariômetro (www.salarios.org.br) demonstram isso. Portanto, o argumento da fraqueza sindical não se sustenta.
Além de não se sustentar, o argumento traduz uma visão estreita, que vê na negociação coletiva apenas um jogo de soma zero e ignora as oportunidades de ganhos mútuos que surgirão.
Tomemos o conhecido exemplo do intervalo de almoço, que a CLT estabelece em uma hora. Muitos trabalhadores gostariam de negociar uma redução para meia hora, mas isso não é possível, devido à supremacia da lei. Com a reforma trabalhista, esse arranjo poderá ser negociado com segurança jurídica, proporcionando ganhos para os trabalhadores (que sairão mais cedo) e para a empresa (que cortará custos desligando máquinas e consumindo menos energia). Este é apenas um exemplo.
Certamente a prevalência do negociado criará espaços para arranjos ganha-ganha semelhantes. Não haverá perda de direitos. Pelo contrário, será possível usar melhor os direitos existentes.

Fonte: O Estado de São Paulo, por Hélio Zylberstajn, 27.04.2017

10 perguntas e respostas sobre a reforma trabalhista.

A Câmara dos Deputados aprovou na noite de quarta-feira (26) a reforma trabalhista (PL 6787/16), projeto de autoria do governo de Michel Temer.
A medida é uma das apostas do Executivo para superar a crise econômica atravessada pelo Brasil, em conjunto com o teto de gastos públicos (já aprovado), a terceirização do trabalho (já aprovada) e a reforma da Previdência (que ainda precisa ser votada na Câmara e no Senado).
A própria reforma trabalhista ainda está em trâmite, pois precisa passar por mais votações, incluindo o Senado. Ou seja, seu texto ainda pode mudar até que seja, enfim, sancionado pelo presidente.
O projeto do governo que avança no Congresso tem um ponto central, que dificilmente será alterado: os termos acertados entre funcionários e patrões vão se sobrepor à lei escrita. É a lógica do “acordado sobre o legislado”.
Se um conflito for levado à Justiça do Trabalho, o que valerá é o acordo entre empregador e empregado, e não o que determina a CLT (Consolidação das Leis de Trabalho).
Na prática, muitas regras rígidas poderão ser flexibilizadas durante os acordos. Há, no entanto, alguns limites a serem respeitados. Abaixo, Nexo responde algumas das principais questões a respeito da mudança
1. Por que o governo quer fazer uma reforma trabalhista?
O argumento oficial é que a CLT, criada em 1943 no governo de Getúlio Vargas, precisa ser modernizada. Para o governo, hoje a lei ela engessa o mercado de trabalho, dificulta a geração de empregos e, consequentemente, se transforma em uma barreira para a recuperação econômica.
O governo acredita que é positivo dar mais liberdade para o trabalhador definir seus próprios termos de trabalho com o patronato, e nega a possibilidade de que isso abra espaço para exploração. A flexibilização seria positiva uma vez que, hoje, a lei é muito detalhista e sobrecarrega a Justiça do Trabalho – essa é a tese de apoio à reforma.
“[Quero] combater certa tese que dizem que, ao pensar em reforma trabalhista, estamos querendo eliminar direitos. Pelo contrário, o que queremos é manter empregos, e manter emprego é manter a arrecadação que o emprego dá ao poder público brasileiro” (Michel Temer – Presidente da República)
2. Por que há forte resistência das centrais sindicais?
As centrais sindicais são contra a reforma. Elas argumentam que a tese do governo de que a nova lei ajudaria na recuperação econômica não se sustenta, uma vez que não conseguirá criar novos postos de trabalho. O único resultado seria a precarização do que já existe.
Para a CUT, a negociação direta entre patrões e empregados, em um momento de recessão e desemprego, favorece o estabelecimento de regras exploratórias. Em resumo, a reforma praticamente acaba com a CLT.
“De uma forma geral o projeto tem como objetivo anular os direitos conquistados em mais de 70 anos de lutas sindicais e sociais no Brasil. Nem o Regime Militar, que instalou no país um modelo de acumulação de capital extraordinário ousou tanto” (Central Única dos Trabalhadores – Em texto publicado em seu site)
3. O que acontece com a jornada dos trabalhadores?
Na lei antiga, a jornada de trabalho é limitada hoje a 8 horas diárias. A CLT autoriza um limite de até 10 horas diárias (8 horas com acréscimo de até 2 horas extras) em casos de acordo, mas deve-se respeitar o limite semanal, de 44 horas.
Caso a reforma passe como está, o tema poderá ser negociado dentro dos seguintes termos: limite diário de 12 horas, semanal de 48 horas (sendo 4 horas extras), e fica estabelecido o limite mensal de 220 horas. Caso um funcionário trabalhe 12 horas seguidas, tem direito a 36 horas seguidas de descanso.
Deslocamento
A CLT também prevê nos casos em que o empregador fornece transporte em razão do díficil acesso ao local de trabalho, o tempo gasto nesse deslocamento é conta como jornada diária do trabalhador. Isso deixará de existir com a aprovação final da reforma.
Descanso
O funcionário que trabalha mais de 6 horas por dia tem direito a no mínimo 1 hora de descanso para se alimentar ou repousar. Isso poderá, com as novas regras, ser objeto de acordo, com um mínimo de 30 minutos – nesse caso, o trabalhador pode ir para casa 30 minutos mais cedo.
Banco de horas
Os termos do banco de horas poderão, com a reforma, ser negociados individualmente, com um prazo máximo de seis meses para compensar o excesso de horas trabalhadas. Hoje, o acordo deve ser coletivo, com um prazo máximo de um ano para compensação. Caso o prazo seja excedido, a lei permanece igual: compensação em dinheiro com acréscimo de 50%.
4. O que acontece com o 13º salário?
A lei permanece a mesma. O funcionário tem direito a receber um salário adicional por ano, podendo ser parcelado em duas vezes: uma parcela quitada até no máximo 30 de novembro e a segunda, 20 de dezembro. A nova lei estabelece que o 13º não pode ser objeto de acordo.
5. O que acontece com as férias?
A lei em vigor prevê que as férias anuais de 30 dias podem ser divididas em no máximo duas vezes que não podem ter período inferior a 10 dias. A proposta autoriza parcelar em até 3 vezes, sendo que um dos períodos de descanso deve ter no mínimo 15 dias, e nenhum pode ser inferior a 5 dias.
6. O que acontece com o FGTS?
Assim como o 13º salário, o FGTS também não poderá ser objeto de acordo. O que pode ser acordado é o acesso ao fundo. Hoje, se o empregado se demite, ele não tem direito a saque. Se é demitido sem justa causa, pode sacar o FGTS integralmente, com multa de 40% para o empregador. O projeto abre a possibilidade da demissão em comum acordo. Nesse caso, a multa do FGTS paga pelo empregador cai para 20%, e o trabalhador passa a poder sacar 80% do fundo – mas para isso teria que abrir mão do seguro-desemprego.
7. O que acontece com contratos temporários?
A lei da terceirização, que já está valendo, estabeleceu um prazo máximo de 180 dias, prorrogáveis por mais 90 – totalizando um máximo 270 dias – para os contratos temporários. A reforma trabalhista estabelece um novo limite para o contrato temporário de 120 dias, que pode ser prorrogado pelo dobro do contrato inicial – totalizando 240 dias.
8. O que acontece com o trabalho em tempo parcial?
Os contratos de trabalho em tempo parcial tinham limite de 25 horas semanais. A reforma eleva esse limite para 30 horas semanais, ou 26 horas com a possibilidade de mais 6 horas extras – totalizando 32 horas semanais. Isso faz com que o novo limite de trabalho parcial (32 horas) seja menor que o antigo limite de contratos integrais (44 horas) em 27%, e em 37% quando comparado ao novo limite (48 horas).
9. O que acontece com quem faz home office?
Com a reforma, a atividade passa a ser regulamentada e sujeita a contrato individual. Hoje não é. O reembolso de equipamentos e infraestrutura (compra de computador, internet e energia utilizada pelo trabalhador, por exemplo) devem ser negociados entre funcionário e patrão. O patrão também poderá decidir alterar o regime de home office para presencial, devendo avisar o funcionário com 15 dias de antecedência. Precauções contra doenças e acidentes de trabalho serão responsabilidade do empregado, cabendo ao patrão “instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva” sobre o tema.
10. Como ficam as ações na Justiça do Trabalho?
Atualmente, o trabalhador pode faltar a até três audiências na Justiça do Trabalho e não é obrigado a arcar com os custos do processo caso perca a ação, coberto pelo poder público. O projeto do governo exige o comparecimento a todas as audiências (salvo se a falta for justificável) e o pagamento do processo pelo trabalhador se ele perder – a menos que comprove não ter recursos suficientes. Além disso, o projeto prevê que o advogado do empregado que recorrer à Justiça defina, previamente, exatamente quanto quer receber com o processo. Caso o juiz julgue má-fé de alguma das partes, ela poderá ser punida com uma multa que vai de 1% a 10% do valor da causa.
O fim do imposto sindical
A reforma trabalhista também acaba com a obrigatoriedade do imposto sindical. Atualmente, um dia do ano do salário do trabalhador vai oficialmente para entidades sindicais. O projeto que passou na Câmara elimina a obrigatoriedade. Os parlamentares, porém, ainda querem aprovar emendas que garantam uma transição para a extinção da contribuição, para que ela deixe de ser obrigatória de forma gradual.

Fonte: Jornal Nexo, por Rafael Iandoli, 27.04.2017

Empregador que não forneceu EPI e empregado negligente são responsabilizados na Justiça.

Uma decisão ruim, um prego martelado em madeira dura, um ricochete, a falta de um óculos de proteção e a visão do olho direito comprometida para o resto da vida. Acidentes de trabalho ocorrem por descuido e falta de prevenção e trazem consequências ruins para a vítima e, muita das vezes, também para o empregador. Seu Antônio e Valtair são duas pessoas que acabaram descobrindo isso da pior maneira possível.
O primeiro contratou o segundo para trabalhar em sua pequena propriedade, na região de Mirassol D’Oeste, interior de Mato Grosso, onde criava um diminuto rebanho bovino. Numa certa ocasião, ele pediu que o trabalhador, seu único empregado, consertasse um buraco na cerca. Mas não se certificou de fornecer os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) necessários ao serviço.
Cumprindo as ordens do patrão, Valtair escolheu uma madeira velha e, como ferramenta de trabalho, um martelo e pregos. No momento em que o segundo prego seria fixado, a madeira muito dura resistiu, fazendo-o ricochetear e acertar o olho direito do empregado. Cego, o trabalhador procurou a Justiça do Trabalho jogando a culpa pelo acidente sobre o antigo patrão. O motivo? Não lhe ofereceu os equipamentos necessários para realizar o serviço.
O pequeno fazendeiro acabou condenado. “Como entre os serviços atribuídos ao reclamante estava o de efetuar consertos nas cercas, onde utilizaria madeira e pregos, o empregador teria que fornecer o EPI necessário para essa atividade, ainda que esporádicas, justamente para evitar fatalidades como a que ocorreu com o autor”, destacou a desembargadora Eliney Veloso, que relatou o caso no TRT de Mato Grosso.
A culpa do patrão acabou comprovada, mas a Justiça identificou que o trabalhador também foi responsável pelo acidente de trabalho. Isso porque Valtair admitiu em seu depoimento que sabia que o procedimento correto para pregar as tábuas em cercas era o uso de uma furadeira, e não de martelo, como ele mesmo escolheu, para fazer a marcação do local e evitar um possível ricochete do prego.
“A inexorável conclusão a que se chega é que, ao tempo em que deveria o réu ter disponibilizado ao autor óculos de segurança, também é de se considerar que o autor, conhecedor da técnica e procedimento, não só se omitiu quanto ao emprego da ferramenta correta como na verdade pulou esta etapa do procedimento” destacou a relatora. A Justiça do Trabalho acabou então considerando-os culpados, numa proporção de 50% para cada lado.
Diante dessa constatação, ao estabelecer os valores das indenizações por dano moral e material decorrentes do acidente, o montante a ser recebido pelo trabalhador ficou limitado à metade do que lhe seria devido se não tivesse culpa alguma.
( 0000286-10.2015.5.23.0091 )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 23ª Região Mato Grosso, por Zequias Nobre, 27.04.2017

Concordância de empregado com imposição de venda de férias não isenta empregador de ressarcir os dias de descanso não usufruídos.

O empregado pode requerer a conversão em dinheiro de 1/3 de suas férias anuais, o que equivale ao período de 10 dias, se considerando o prazo padrão de 30 dias. É uma faculdade conferida por lei e que se conhece por abono de férias ou abono pecuniário. Mas em razão dos objetivos das férias de garantir a saúde e segurança do trabalhador, bem como de seu convívio familiar, comunitário e político, a venda das férias não pode ser imposta pelo patrão. Ou seja, o empregado não pode ser forçado a vender suas férias, devendo fazê-lo somente por opção, conforme dispõe o artigo 143 da CLT.
E foi justamente esse o fundamento usado pelo desembargador Paulo Chaves Correa Filho, em sua atuação na 4ª Turma do TRT mineiro ao negar recurso da instituição financeira empregadora e manter a decisão de 1º grau que a condenou a pagar, em dobro, 10 dias de férias anuais não usufruídas (abono de férias) a um operador de crédito. Como registrou o relator, contrariando o argumento de que o trabalhador teria se valido da faculdade de receber o abono pecuniário, as testemunhas revelaram que havia uma política patronal interna no sentido de obrigar os empregados a venderem 10 dias de férias.
“Trata-se, conforme se infere, de faculdade conferida ao empregado, sendo, pois, ilegítima a imposição do empregador à conversão em pecúnia de 10 dias de férias” , concluiu o julgador, esclarecendo, por fim, que eventual anuência do empregado com a conversão de parte das suas férias em abono pecuniário não é capaz de afastar a ilicitude da conduta adotada pela empregadora, a quem é vedado impor essa condição.
Por essas razões, o julgador manteve a condenação, entendimento esse que foi acompanhado pelos demais julgadores da Turma.
( 0011097-73.2016.5.03.0148 )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 27.04.2017

Supressão de um dos dias de folga do trabalhador sem pagamento afronta boa fé e gera indenização.

No contrato de trabalho, empregador e empregado devem agir de acordo com os ditames do princípio da boa fé objetiva, princípio esse que pode ser traduzido como lealdade e confiança (artigo 422 do CC). Em termos gerais, como explicou o juiz Tarcísio Correa de Brito, ao julgar um caso que envolveu a matéria na Vara do Trabalho de Cataguases, a boa fé objetiva é uma cláusula geral que impõe às partes o dever de manterem um comportamento marcado pela lealdade, honestidade, cooperação, de modo que uma não lese a legítima confiança depositada pela outra.
No caso analisado pelo julgador, um trabalhador sofreu uma alteração em sua jornada por determinação unilateral de sua empregadora, uma fábrica de tecidos: até julho de 2012 ele cumpria escala de seis dias de trabalho por dois de descanso e a partir dessa data passou a trabalhar na escala de 6×1, na mesma jornada, sem qualquer contraprestação. Para a empregadora, a alteração ocorreu por força das dificuldades financeiras que atravessava, o que a obrigou a extinguir a chamada quarta turma, na qual o trabalhador atuava, para a qual estava previsto em norma coletiva jornadas em turnos de revezamento 7h20min, seis vezes por semana e com dois dias de folga. Assim, com a extinção, os empregados dessa turma foram realocados em outras atividades, agora sujeitos aos turnos regulares de 6×1.
Mas a tese patronal não convenceu o julgador que, refutando os argumentos, explicou ser vedado ao empregador transferir para os empregados os riscos de sua atividade econômica, como dita o princípio da alteridade (artigo 2, §2º, da CLT). Ele ponderou ser inerente ao negócio da empresa a possibilidade de enfrentamento de crises econômicas e adversidades de mercado, razão pela qual os ônus decorrentes da atividade empresarial devem ser por ela suportados. Considerando inegável que a empresa tinha o poder de organizar o setor onde o trabalhador atuava, o magistrado frisou que esse poder deveria ter sido exercido, mas não de modo a causar prejuízo ao empregado, que foi privado de dias de descanso, conforme ajustado em ACT.
Para o julgador, a conduta empresarial afrontou não só os princípios da não alteração contratual lesiva e da alteridade, mas o da boa fé objetiva. “Tecnicamente, em nome da segurança e da confiança, veda-se que um agente, em momentos diferentes, adote comportamentos contraditórios entre si, prejudicando outrem”, esclareceu o juiz. Ele citou ainda, como desdobramento da boa fé objetiva o tu quoque. “Trata-se de uma partícula extraída da célebre frase dita Júlio César ao ser apunhalado, covardemente e de surpresa, por seu filho: tu quoque Brutus filie mi (“até tu Brutos, filho meu”). Assim, o tu quoque, quando aplicado na relação privada, pretende evitar a quebra da confiança pelo comportamento marcado pela surpresa ou ineditismo” , registou o magistrado, concluindo que foi exatamente o que se apurou no caso: “a quebra da confiança, o ineditismo, a prática de um ato inesperado e a falta de lealdade por parte da ré”.
Por essas razões, o julgador condenou a empregadora a indenizar o trabalhador, pagando a ele, como extras, as horas trabalhadas após as folgas semanais regularmente concedidas, a cada seis dias trabalhados, a partir de julho de 2012, de acordo com os cartões de ponto, e devidos reflexos.
A empregadora recorreu da decisão, que ficou mantida pelo TRT mineiro.
( 0011761-04.2016.5.03.0052 RO )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 27.04.2017

Supressão de um dos dias de folga do trabalhador sem pagamento afronta boa fé e gera indenização.

No contrato de trabalho, empregador e empregado devem agir de acordo com os ditames do princípio da boa fé objetiva, princípio esse que pode ser traduzido como lealdade e confiança (artigo 422 do CC). Em termos gerais, como explicou o juiz Tarcísio Correa de Brito, ao julgar um caso que envolveu a matéria na Vara do Trabalho de Cataguases, a boa fé objetiva é uma cláusula geral que impõe às partes o dever de manterem um comportamento marcado pela lealdade, honestidade, cooperação, de modo que uma não lese a legítima confiança depositada pela outra.
No caso analisado pelo julgador, um trabalhador sofreu uma alteração em sua jornada por determinação unilateral de sua empregadora, uma fábrica de tecidos: até julho de 2012 ele cumpria escala de seis dias de trabalho por dois de descanso e a partir dessa data passou a trabalhar na escala de 6×1, na mesma jornada, sem qualquer contraprestação. Para a empregadora, a alteração ocorreu por força das dificuldades financeiras que atravessava, o que a obrigou a extinguir a chamada quarta turma, na qual o trabalhador atuava, para a qual estava previsto em norma coletiva jornadas em turnos de revezamento 7h20min, seis vezes por semana e com dois dias de folga. Assim, com a extinção, os empregados dessa turma foram realocados em outras atividades, agora sujeitos aos turnos regulares de 6×1.
Mas a tese patronal não convenceu o julgador que, refutando os argumentos, explicou ser vedado ao empregador transferir para os empregados os riscos de sua atividade econômica, como dita o princípio da alteridade (artigo 2, §2º, da CLT). Ele ponderou ser inerente ao negócio da empresa a possibilidade de enfrentamento de crises econômicas e adversidades de mercado, razão pela qual os ônus decorrentes da atividade empresarial devem ser por ela suportados. Considerando inegável que a empresa tinha o poder de organizar o setor onde o trabalhador atuava, o magistrado frisou que esse poder deveria ter sido exercido, mas não de modo a causar prejuízo ao empregado, que foi privado de dias de descanso, conforme ajustado em ACT.
Para o julgador, a conduta empresarial afrontou não só os princípios da não alteração contratual lesiva e da alteridade, mas o da boa fé objetiva. “Tecnicamente, em nome da segurança e da confiança, veda-se que um agente, em momentos diferentes, adote comportamentos contraditórios entre si, prejudicando outrem”, esclareceu o juiz. Ele citou ainda, como desdobramento da boa fé objetiva o tu quoque. “Trata-se de uma partícula extraída da célebre frase dita Júlio César ao ser apunhalado, covardemente e de surpresa, por seu filho: tu quoque Brutus filie mi (“até tu Brutos, filho meu”). Assim, o tu quoque, quando aplicado na relação privada, pretende evitar a quebra da confiança pelo comportamento marcado pela surpresa ou ineditismo” , registou o magistrado, concluindo que foi exatamente o que se apurou no caso: “a quebra da confiança, o ineditismo, a prática de um ato inesperado e a falta de lealdade por parte da ré”.
Por essas razões, o julgador condenou a empregadora a indenizar o trabalhador, pagando a ele, como extras, as horas trabalhadas após as folgas semanais regularmente concedidas, a cada seis dias trabalhados, a partir de julho de 2012, de acordo com os cartões de ponto, e devidos reflexos.
A empregadora recorreu da decisão, que ficou mantida pelo TRT mineiro.
( 0011761-04.2016.5.03.0052 RO )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 27.04.2017