A modernização das relações do trabalho é essencial porque no mundo moderno ninguém quer ser obrigado a nada. Sim. Se tem algo que cada vez é mais latente nessa geração de trabalhadores e empreendedores é o anseio por liberdade, por deter as rédeas da vida em todos os aspectos, inclusive no trabalho.
Não é por acaso que pesquisa recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em parceria com IBOPE, constatou que o brasileiro quer mais liberdade para negociar rotinas de trabalho flexíveis. Mais de 80% das pessoas relataram que gostariam de poder trabalhar de casa, enquanto 73% informou querer poder definir a própria jornada de trabalho.
Nesse sentido a legislação trabalhista atual está ultrapassada, a começar pelo engessamento na relação entre empregado e empregador digna do contexto no qual ela foi criada, em que eram necessárias regras rígidas para proteger os trabalhadores que vinham do campo para os grandes centros urbanos. Há que se respeitar esse contexto e valorizar as legislações criadas. Contudo aquela superproteção ao trabalhador, anteriormente necessária, atualmente atrapalha as relações laborais.
Um exemplo emblemático é o horário de almoço. Um empregado, por lei, deve ter entre uma e duas horas de almoço diariamente, para alimentação e repouso. Porém, se na empresa houver um refeitório e diariamente um empregado, que tem 1 hora de intervalo, levar 40 minutos para almoçar e descansar, ele não pode negociar com o seu empregador voltar ao seu posto de trabalho 20 minutos antes, para sair 20 minutos mais cedo. Seria essa uma escolha a ser feita pela lei ou pelo empregado, que conhece os seus hábitos de alimentação, a sua rotina familiar, o trânsito que enfrenta ao sair do trabalho?
Esse é um exemplo de engessamento da lei trabalhista que, defasada, faz com que todo o universo de trabalhadores tenha que se submeter a uma padronização muitas vezes em confronto com a realidade, com o perfil do mercado de trabalho atual e com os anseios dos próprios trabalhadores. É obvia a necessidade de se ter garantias mínimas, como é o tempo para almoçar e descansar, porém o tamanho desse intervalo é uma decisão que diz respeito a cada trabalhador e a cada empresa, a depender do seu porte, do local onde estão, da atividade exercida.
Quer outro paradoxo? Enquanto há empresas no Reino Unido que oferecem aos empregados escolherem quantos dias querem ficar de férias, nossa legislação brasileira proíbe o fracionamento desse período de descanso, que aqui é de 30 dias. Também não pode o trabalhador, por exemplo, fracionar suas férias, dividindo-as em períodos curtos, para juntá-los com feriados prolongados, para uma viagem com os filhos em períodos fora das férias escolares, fugindo de períodos de pico. E assim, quem quiser viajar, terá que se submeter às tarifas mais caras dos períodos considerados de alta temporada.
Esses são exemplos pontuais de barreiras que a legislação trabalhista cria, que impedem avanços do ambiente de negócios do País – pois as empresas perdem com a burocracia administrativa e com a falta de alternativas para a gestão das pessoas e do processo produtivo – e, por vezes, vão de encontro ao desejo do próprio trabalhador. E, com isso, a relação entre empresas e empregados vai ficando minada, pois o diálogo não ocorre a partir do entendimento dos anseios das duas partes, e sim em torno do que é possível fazer sem que se gere insegurança jurídica.
Por isso, modernizar a legislação trabalhista é essencial. Só assim haverá espaço para ajustar as relações de trabalho, tornando-as flexíveis em prol da possibilidade de gestão e definição pelos próprios empregados e empregadores das regulamentações de temas específicos a sua realidade de trabalho. Esse é o caminho para a busca de soluções negociadas.
É preciso afastar o mito de que “são os trabalhadores, mais uma vez, que têm que pagar a conta”. Se o Brasil hoje tem 13,5 milhões de desempregados e mais de 16 mil empresas que abriram falência só em 2016, quem paga a conta é toda a população, é todo o país. Ao invés de buscar culpados e injustiçados, precisamos, em benefício de todos, buscar soluções para reverter a crise, e, assim, atrair investimentos para que sejam retomados postos de trabalho, pois sem investimento não há empresas, e sem empresas não há empregos.
Nesse mesmo sentido, sindicatos de trabalhadores e sindicatos de empresas devem atuar, almejando realizar negociações que, longe de suprimir direitos, serão o melhor caminho para preservá-los por propiciarem condições justas e adequadas aos atores envolvidos.
Modernizar as relações de trabalho não é uma agenda momentânea, fruto da crise. É uma agenda de longa data, que poderia já ter sido enfrentada em tempos de bonança, mas infelizmente não foi. O cenário agora demanda soluções realistas, sem posições dogmáticas e rígidas, pois essas não mais se adequam ao mundo do trabalho moderno e dinâmico, em que é possível alguém do Brasil trabalhar, de sua casa, para uma empresa no Japão, por exemplo.
Cabe a nós brasileiros nos desvencilharmos da visão paternalista e protetora da legislação do trabalho e encarar a necessidade de transformar a legislação defasada em espaços de negociação favoráveis a um modelo sustentável de relações do trabalho que promova a proteção e o bem estar de toda a sociedade.
(*) Monica Messenberg é Diretora de Relações Institucionais da CNI.
Fonte: CNI, por Monica Messenberg (*), 26.04.2017
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