Se for aprovada, a reforma trabalhista deve tornar inevitável a reforma sindical.
Inúmeras propostas nessa direção estão paradas no Congresso. A novidade que pode destravá-las é o novo tratamento a ser dado à contribuição sindical obrigatória, o imposto sindical. Pelo atual projeto ela pode ser extinta ou transformada em voluntária. O relator da reforma trabalhista, Rogério Marinho (PSDB-RN), avisa que o dispositivo separará sindicatos sérios dos sindicatos pelegos.
Em 2016, o imposto sindical rendeu R$ 3,6 bilhões. Corresponde ao desconto de um dia de salário por ano dos trabalhadores com registro na carteira de trabalho e, no caso dos sindicatos patronais, à cobrança de 0,02% a 0,8% do capital social das empresas.
O ex-ministro do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto adverte que a reforma trabalhista não será suficiente para separar o joio do trigo. Será preciso rever o estatuto da unicidade sindical.
Garantido pela Constituição, o princípio da unicidade sindical proíbe que, no mesmo município, haja mais de um sindicato por categoria profissional (no caso dos sindicatos laborais) ou por categoria econômica (dos sindicatos patronais). Exemplo: no Município de São Paulo só pode haver um sindicato dos bancários.
O princípio da unicidade foi admitido para evitar proliferação de sindicatos. Mas deu o contrário. A Alemanha, por exemplo, só tem 11 sindicatos e o Reino Unido tem 168. No Brasil, são 16,5 mil sindicatos registrados , número em crescimento porque o imposto sindical atrai aproveitadores cujo objetivo não é a defesa dos direitos do trabalhador, mas meter a mão no dinheiro.
A exigência da unicidade sindical é problema porque, uma vez estabelecido um sindicato fajuto, não pode ser criado outro no município. Restaria a hipótese de que outro grupo, identificado com os interesses do trabalhador, tomasse o poder. Na prática, isso é raro, porque as diretorias se perpetuam na direção. Em 2015, 8,5 mil dirigentes sindicais completaram mais de 10 anos nos cargos.
A Justiça do Trabalho está atolada em processos. Mas novas disputas sindicais aumentam essa carga. Dos 2,7 milhões de ações que chegaram às varas do Trabalho em 2016, cerca de 100 mil tratavam do funcionamento dos sindicatos. Dessas, 29 mil questionavam a aplicação do princípio da unicidade, representação, registro ou enquadramento por categoria.
O professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e da FGV Paulo Sérgio João observa que, além de ter de decidir qual sindicato tem poder de representação, a falta de transparência e as disputas têm levado juízes a fiscalizar negociações e acordos coletivos. Ou seja, “nem a Justiça do Trabalho confia nos sindicatos”.
De todo modo, o fim da contribuição sindical obrigatória não esgota o debate sobre a atuação dos sindicatos. Uma vez que passe a prevalecer o negociado sobre o legislado, como pretende a reforma trabalhista, terá ainda mais peso saber quem vai negociar por uma categoria: um sindicato oficial, porém pouco representativo, ou o que reúne mais filiados? Se a lei continuar a exigir que haja apenas um sindicato por base territorial, será difícil garantir que trabalhadores terão bons acordos e que ficarão mais estimulados a participar das negociações. “O sindicato tem que ser democrático e não pode depender do Estado”, diz Pazzianotto.
Fonte: O Estado de São Paulo, por Celso Ming e Raquel Brandão, 26.04.2017
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