Em julho deste ano, durante uma sessão de perguntas e respostas no Facebook, a ex-secretária de Estado americana e pré-candidata à presidência dos EUA Hillary Clinton recebeu uma pergunta sobre sua aparência. A funcionária da rede social Libby Brittain perguntou a Hillary se ela sentia pagar um “imposto de maquiagem e cabelo” — o tempo e o dinheiro extra que ela, como mulher em posição de liderança e de exposição pública, gastaria diariamente para manter a boa aparência. “Amém, irmã”, respondeu Hillary, adicionando que sabia exatamente do que Libby falava. “É um desafio diário”, escreveu.
Hillary e Libby não estão erradas em considerar essa cobrança uma atividade diária, ao menos de acordo com um estudo global sobre liderança, realizado pela empresa de comunicação Ketchum. Os dados mostram que, embora mulheres sejam vistas como donas de mais atributos importantes para a liderança do que homens, elas ainda são mais exigidas em relação à aparência.
A pesquisa falou com mais de 6 mil pessoas em 12 mercados, entre eles o Brasil, com a intenção de avaliar a expectativa da população geral quanto a lideranças de empresas, governo e terceiro setor.
Questionados sobre as qualidades mais importantes para que uma pessoa assuma uma posição de liderança, os brasileiros listaram ter inteligência, ser alguém agradável, ser amigável e ter carisma e senso de humor. Para eles, tanto líderes homens quanto mulheres precisam reunir todas essas características — embora um número um pouco maior ache que “ser amigável” é mais relevante para mulheres. Já os traços “charme” e “boa aparência” foram considerados importantes para mulheres por um número maior de pessoas.
Para 43% dos respondentes, é importante para uma mulher ter boa aparência se ela quiser ser líder, enquanto 31% pensam o mesmo de homens. Mais de um terço (35%) acha que mulheres líderes precisam ter charme, enquanto só 22% consideram o mesmo de homens. Na média global, essa diferença é ainda mais pronunciada — só 23% acham que homens líderes precisam ter boa aparência, enquanto 38% acham o mesmo de mulheres.
Na opinião de Silvia Fazio, presidente da Women in Leadership in Latin America (Will), organização não-governamental que discute a presença de mulheres em posições de liderança, há uma cobrança maior para mulheres adotarem uma certa aparência — e esta vem de diversos lados, como dos colegas, do mercado ou da opinião pública. “Infelizmente a aparência hoje é importante para todos, mas a mulher tem que estar sempre impecável, enquanto o homem não sente uma pressão tão grande”, diz. Para Silvia, a cobrança não é exclusividade do mercado de trabalho — que reflete a pressão por padrões de beleza enfrentada por mulheres no geral — mas em um ambiente profissional pode aparecer, por exemplo, em “boicotes velados”, como a pessoa deixar de ser convidada para reuniões com clientes importantes.
De acordo com a pesquisa, as mulheres foram consideradas pelos respondentes brasileiros mais capazes de ter quatro dos cinco atributos mais importantes de um líder efetivo: ter uma comunicação transparente, admitir erros, respeitar a cultura e a história da organização onde atuam e liderar com base em valores claros. Já conseguir resolver crises e assuntos controversos com mais calma e confiança foi uma habilidade atribuída aos líderes homens com mais frequência.
“Quando se faz a análise em relação a qual gênero tem mais atributos de uma liderança efetiva, a mulher atende bem às expectativas”, diz Mônica Brissac, diretora de atendimento da Ketchum no Brasil. No entanto, quando os respondentes foram questionados sobre qual líder seria mais capaz de assumir o papel durante os desafios econômicos e sociais dos próximos cinco anos, mais pessoas preferiram um líder homem neste ano do que no passado (aumento de 43% para 51%). Embora no Brasil o número fique equilibrado — 49% escolheram líderes mulheres — no mundo essa diferença é maior, com 61% preferindo homens. Os mesmos respondentes, globalmente, consideram que mulheres são mais capazes de terem três dos cinco atributos considerados mais importantes para liderança: comunicação transparente, admitir erros e conseguir tirar o melhor da equipe.
Segundo os responsáveis pela pesquisa, os números refletem a percepção de que o homem é uma liderança melhor para momentos de crise por ser considerado mais capaz de lidar com estratégias de curto prazo. “Em um momento global complicado, as pessoas acreditam que o homem tem mais a visão de resolver problemas imediatos”, diz Christiano Bianco, gerente de contas da Ketchum.
Fonte: Valor Econômico, por Letícia Arcoverde 28.08.2015
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