segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Especial – Quanto ganha o RH?

Pergunte a um caçador de talentos qual é o profissional mais requisitado hoje em dia. Qualquer um dirá que o executivo de recursos humanos está entre os três mais demandados pelo mercado — e é um dos mais difíceis de achar. O resultado desse desequilíbrio entre oferta e procura se reflete nos salários.
De acordo com a pesquisa anual realizada pela consultoria Deloitte, a remuneração do RH em geral mais do que dobrou nos últimos dois anos. De 2012 a 2013, apenas o salário do diretor de RH cresceu 18%.
Mas, afinal, quanto ganha cada funcionário da área que cuida da gestão de pessoas? E qual a carreira financeiramente mais promissora dentro do RH?
Para responder a essas perguntas, VOCÊ RH realizou, em parceria com a Deloitte, uma pesquisa que mapeou a remuneração de 18 cargos da área de recursos humanos — de analista a vice-presidente. Fizeram parte da análise 118 empresas, de dez setores da economia, sendo 64% delas com faturamento acima de 200 milhões de reais.
Das companhias participantes, 42% têm um líder de RH com o cargo de vice-presidente ou diretor (em inglês, conhecido como CHRO). “Cada vez mais o gestor de pessoas tem subido um nível: quem era gerente virou diretor, e o diretor subiu a vice-presidente”, diz Roberta Rebouças Yoshida, diretora da área de consultoria e gestão de capital humano da Deloitte.
Para ela, esse é o primeiro indicador de que os empresários veem o RH hoje como uma área relevante — e não mais uma área de suporte, como costumou ser descrita por muito tempo.
Outro indicador é o número de vagas abertas no mercado. De acordo com Luiz Carlos Cabrera, sócio da Amrop Panelli Motta Cabrera, consultoria especializada em busca de executivos de alto escalão, existem atualmente 15 vagas em grandes corporações esperando um profissional experiente de recursos humanos.
Nessas grandes companhias, onde o básico da gestão de pessoas já foi feito, o desafio do profissional é “maximizar a estrutura que a empresa tem disponível”, diz Marcelo Cuellar, headhunter da Michael Page.
Para dar conta dessa tarefa, o executivo de RH começa a redesenhar sua área, deixando-a mais robusta e estruturada. Os cargos generalistas começam a dar espaço a organogramas complexos, compostos de um CHRO, seguido por especialistas em recrutamento e seleção, remuneração e benefícios, e treinamento e desenvolvimento, além de consultores internos (os chamados business partners) e centros de serviços. E não são apenas as grandes empresas que estão revirando suas estruturas.
Nas companhias de médio porte, nas quais o cargo máximo da área de gestão de pessoas era de gerente de RH, o CHRO já começa a aparecer. Fenômeno similar vem acontecendo nas empresas familiares e nos negócios embrionários.
Se antes essas companhias mal contavam com uma área de RH, hoje estão contratando alguém para criar ou profissionalizar a gestão de pessoas. “As startups, assim como as companhias familiares e de pequeno e médio porte, são as grandes contratantes de profissionais de RH”, diz Bernardo Cavour, da Flow Executive Finders .
Por causa desse movimento do mercado, os cargos generalistas ainda são maioria nas áreas de gestão de pessoas — na pesquisa VOCÊ RH-Deloitte, os gerentes de RH estão presentes em 75% das companhias, com salários que podem variar mais de 20 000 reais.
A remuneração dos diferentes cargos de RH também varia conforme o setor e a função. O setor farmacêutico apresenta níveis salariais elevados, e as funções de treinamento e desenvolvimento são mais valorizadas nas siderúrgicas e nas empresas de serviços, nas quais as práticas de treinamento são mais necessárias.
Muito procurado por um universo maior de empresas, o profissional de RH passou a ser mais valorizado. Para os especialistas, esse novo cenário pode influenciar a trajetória dos jovens que estão saindo das universidades e mudar a imagem negativa que a área carregou durante anos.
RH também tem papel de evangelizador
Quando assumiu a presidência da Bacardi no Brasil, em fevereiro de 2012, Fabio Di Giammarco se surpreendeu ao descobrir que a empresa que operava havia 56 anos no país só contava com um departamento operacional de recursos humanos. “A empresa não cobrava conscientemente de seus funcionários, não cuidava da carreira das pessoas nem passava os objetivos de forma clara e formal”, diz ele.
Sem comunicação e engajamento, seria impossível atingir as metas de Fabio de transformar a Bacardi — cuja operação não crescia havia uma década — na fabricante de destilados de maior crescimento do país.
Por esse motivo, antes de contratar outro executivo, o presidente foi atrás de “uma pessoa forte de recursos humanos”, que o assessorasse nessa transformação. Dois meses e pelo menos 20 candidatos depois, ele chegou a Raquel Alvarenga, que assumiu a diretoria de RH da Bacardi para Brasil, Paraguai e Uruguai.
Fabio não está sozinho nessa história. Segundo os ­headhunters, é notório o crescimento de presidentes que buscam um diretor ou VP de RH para apoiá-los em missões transformadoras. Na Flow Executive Finders, houve um aumento de 30% nessa busca em relação a 2012.
Na Fesa, outra consultoria de recrutamento de executivos, hoje a principal demanda é pelo número 1 da gestão de pessoas. Luiz Carlos Cabrera, fundador da Amrop Panelli Motta Cabrera e acostumado a caçar executivos de alto escalão, diz que o diretor de recursos humanos com esse perfil moderno é a segunda posição mais difícil de preencher no Brasil atualmente. Perde apenas para o presidente.
A forte procura por esse profissional é resultado da necessi­dade atual dos negócios de ouvir um líder de pessoas antes de tomar qualquer decisão estratégica.
No passado, segundo Roberta Yoshida, diretora da área de consultoria e gestão de capital humano da Deloitte, tudo era definido na comissão de executivos e, depois, comunicado ao RH. “Hoje, vemos situações em que o RH é chamado na fase anterior para avaliar o valor de uma fusão antes de ela ser fechada”, afirma ela.
Influência maior, remuneração também maior. Se antes o principal executivo de recursos humanos ganhava menos do que seus pares em finanças ou ­marketing, hoje seu salário está no mesmo patamar desses profissionais.
Segundo a pesquisa anual de salários da Deloitte, em 2012 o diretor de RH chegou a ganhar 4% mais do que o diretor administrativo-financeiro e 3% mais do que o de marketing. Assim como a de seus pares, parte dos ganhos do executivo de RH vem da remuneração variável, com metas atreladas aos resultados do negócio.
É o caso de Maria Aparecida Lamin (conhecida como Pida), diretora de RH da L’Occitane. Antes de Pida ingressar na fabricante de cosméticos, a empresa tinha uma estrutura de departamento de pessoal.
“Era pouco o olhar para investigar por que se contratava, por que se demitia, por que as pessoas vinham para cá e por que elas saíam”, diz a diretora, cuja vaga ficou aberta por um ano até ela ser encontrada. Há dois anos no cargo, Pida já criou métricas para avaliar a rotatividade por loja e para entender o que atrai e afugenta as pessoas da L’Occitane.
Com 450 funcionários diretos e 90 lojas (sendo 76 próprias), a companhia, que acabou de lançar a linha L’Occitane au Brésil, a primeira produzida fora da França, pretende crescer — e toda a estratégia de expansão vai impactar na remuneração da executiva.
“Se você reduz o turnover, reduz o custo de pessoas; se melhora o processo de treinamento, minimiza os custos e as trocas.” Para Bernardo Cavour, da Flow Executive Finder, o executivo de recursos humanos está deixando de ser responsável pela gestão de pessoas e começando a agir como um facilitador para que outros executivos assumam esse papel.
“O RH vira um ponto de apoio de recrutamento, treinamento e remuneração. Não é que ele deixa de existir, mas com isso ele cria uma cultura de gestão de pessoas na empresa”, diz. O desafio agora é fazer com que todas as melhores práticas concebidas dentro da área sejam trabalhadas na cabeça de todas as pessoas da corporação.
Fabio Di Giammarco, da Bacardi, já sabia que ter uma “pessoa forte” de RH traz bons resultados para o negócio. Desde que Raquel entrou na empresa, em abril de 2012, mais 20 gestores foram contratados, e as metas de crescimento foram divulgadas para os trabalhadores de forma clara. Em 2012, a empresa já alcançou um crescimento de mais de 30% de faturamento no Brasil.
O homem do dinheiro é o mais procurado hoje em RH
Cobiçado, raro e muito bem pago. Essas são as características que acompanham o especialista em remuneração. Por causa das mudanças sofridas nos últimos anos nos mecanismos da remuneração, esse profissional tem sido cada vez mais necessário dentro da estrutura de RH. O desafio é encontrá-lo.
Segundo os ­headhunters, o especialista se tornou a “mosca branca” do mercado. Isso porque, além do conhecimento estratégico, ele precisa saber o básico de cálculos matemáticos — e dominar o inglês.
“Existem poucos profissionais, e eles estão inflacionados”, diz Marcelo Cuellar, consultor da Michael Page. De acordo com os próprios especialistas, esse profissional recebe no mínimo uma ligação por mês com proposta de emprego, escolhe onde quer trabalhar e fica em média dois anos em uma organização.
A alta procura versus a pouca oferta se reflete no salário desse profissional. De acordo com a pesquisa VOCÊ RH-Deloitte, de analista a gerente, esse especialista ganha em média 14% mais do que todos os outros profissionais da área de RH — até mais do que os gerentes de administração de pessoal ou de recursos humanos.
“Quando você descobre a ilha da remuneração dentro do RH, é informado de que acaba de entrar para um grupo seleto e não quer pensar em outra área, pois seu passe valoriza muito”, diz Eduardo Martins, diretor de remuneração para a América Latina da Philips.
Há 15 anos nessa especialização, Eduardo, formado em engenharia de produção, passa o tempo desenhando as melhores estratégias de remuneração para não só obter como também não deixar escapar os talentos.
“O que você faz é traduzir a estratégia corporativa em salário, bônus e incentivo de longo prazo (como opções de ações), para tornar o funcionário um acionista e incentivá-lo a se comportar como o dono do negócio”, diz Eduardo. “No fim das contas, a melhor estratégia é a que vai definir quem ganha a briga por talentos.”
Pensar estratégias de remuneração para ter a melhor equipe é uma das razões do aumento pela procura desse especialista. Mas não a única. Apenas nos últimos dez anos, mais de 200 empresas no Brasil abriram o capital na bolsa de valores, forçando a mudança de postura das companhias e estimulando novos arranjos salariais.
“Isso obriga as empresas a ser mais transparentes com seus números, informar os salários de seus executivos à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a pensar em incentivos de longo prazo para os funcionários”, diz Nelson Bravo, consultor da Mercer desde fevereiro, que trabalhou na Vale por sete anos como especialista em remuneração. Além disso, a lei que regula a participação nos lucros e resultados (PLR) sofreu alterações, isentando de impostos alguns negócios.
É esse novo cenário que vem obrigando empresas a trazer para dentro do RH alguém capaz de desenhar a estratégia mais inteligente e competitiva de remuneração de acordo com o negócio — e o segmento. Nas mãos das consultorias, conti­nuam os processos operacionais, como pesquisa salarial ou definição de quadro de remuneração, mas a parte estratégica, que diferenciará a empresa no mercado, precisa ser própria.
Foi por esse motivo que Telma Rodrigues, diretora de gestão de pessoas do Magazine Luiza, buscou no fim de 2012 um gerente de remuneração. A procura demorou oito meses. “Muitos que entendem de salários ainda têm o perfil transacional, do antigo departamento de pes­soal. E, como nenhuma faculdade é voltada para esse conteúdo, os profissionais não conseguem desenvolver o perfil desejado”, diz ela.
Para não ter dificuldades em contratar esse especialista no futuro, Telma, que não revela o nome de seu gerente nem em segredo, já lhe deu uma incumbência: formar sucessores — a mesma prática adotada na Bosch.
Na fabricante alemã de autopeças e ferramentas elétricas, o planejamento sucessório considera que, nas posições mais difíceis (o especialista em remuneração incluído), duas pessoas precisam ser mapeadas e preparadas para assumir a função. Ao longo do tempo, esses profissionais são convidados a participar de projetos para que, assim, ganhem conhecimento e se interessem pela área.
Prevendo que o assédio por seus profissionais aumentará nos próximos anos, até as consultorias estão preocupadas em reter seus especialistas. A Mercer­, que presta serviços de consultoria em remuneração para grandes empresas, criou uma agenda formal de cursos sobre salários e benefícios. Até o fim de 2013, serão seis aulas — uma a cada dois meses. As turmas de 15 alunos já têm adesão de 95%.
Qual é o papel do consultor interno na estrutura de RH?
Quase duas décadas depois de David Ulrich ter lançado o conceito de HR business partner (BP), no livro Human Resource Champions, as empresas ainda confundem o papel desse profissional.
O guru da gestão de pessoas criou a figura do consultor interno de RH com o objetivo de aproximar o departamento da área de negócios. Em sua visão, eles estariam tão alinhados às necessidades dos empresários que, em vez de medir os processos, passariam a mensurar resultados.
“Mas, nessa primeira tentativa das companhias de adotar a figura do BP, algumas não souberam como fazer”, afirma Roberta Yoshida, diretora de consultoria e gestão de capital humano da Deloitte. Ao que parece, no lugar de ser os ouvidos do negócio, o BP virou um grande “tirador de pedidos”.
Nessa confusão de papéis, que vai do estratégico puro a uma espécie de operacional de luxo, o consultor interno acaba tendo um status diferente em cada empresa — o que se reflete diretamente em sua remuneração.
A pesquisa VOCÊ RH-Deloitte mostra que a variação salarial desse profissional é uma das maiores da área de RH: vai de 5 000 reais — o equivalente ao valor pago a um supervisor de treinamento e desenvolvimento — a 13 000 reais.
Na nomenclatura, todos são business partners (ou consultores internos), mas aquele que recebe 5 000 reais está mais para um analista perdido numa grande unidade de negócios sem apoio do que de fato para um parceiro de negócios.
Ao perceber que criaram um cargo sem uma função definida, algumas empresas estão redesenhando sua estrutura para que o consultor interno passe a ter um papel mais estratégico. “Companhias que passaram por essa tentativa e erro agora estão contratando BPs de nível mais sênior, com perfil gerencial”, afirma Roberta, da Deloitte.
Nesse novo perfil, o consultor interno deve ter conhecimento de grande parte dos processos de gestão de pessoas e tem de conhecer o negócio e discutir soluções.
Foi o que aconteceu na ­Johnson & Johnson Medical. Há três anos, a empresa organizou a área de RH seguindo o modelo proposto por David Ulrich.
Hoje, seu departamento conta com uma equipe de business partner que atende unidades ou áreas de negócios, um grupo de especialistas (como de remuneração e benefícios), um centro de serviços transacionais de RH e o time corporativo. Nessa nova configuração, o BP virou um conselheiro do executivo para todos os temas referentes a negócios e pessoas.
Por isso, precisa ter amplo e profundo conhecimento dos negócios, o que não se obtém com menos de sete anos de experiência profissional. “O perfil do business partner é tão importante quanto a estrutura da área”, afirma Fernando Salinas, diretor de RH da Johnson & Johnson Medical.
O trabalho constante do BP é analisar quando deve usar as políticas já estabelecidas da companhia ou criar uma prática específica para aquela unidade e aquele cliente. Ao negar sempre o pedido do cliente, o BP perde a razão de existir. Mas, ao ceder toda hora, ele volta ao papel de tirador de pedido.
Como manter o equilíbrio? Segundo Vania Akabone, diretora de RH da ­Alcoa, o segredo está em fazer as perguntas certas. É comum um gerente de negócios pedir um treinamento para a equipe. “Mas, quando o BP faz as perguntas corretas, percebe que não é a equipe necessariamente que precisa de treinamento, e sim o líder é quem precisa de uma reciclagem, ou é a área que precisa de uma mudança nas posições”, diz Vania. Para ensinar o BP a fazer as perguntas certas, a ­Alcoa mantém um treinamento específico aos consultores de RH.
Na J&J Medical, os três ­business partners da unidade estão passando por um projeto piloto que também serve para desenvolvê-los. Além das áreas de negócios que atendem como consultores, eles receberam um “segundo chapéu”, de processos de RH. Sueli Campos, além de BP para o negócio cardiovascular, corporativo e excelência comercial, cuida do processo de gestão de performance, desenvolvimento e talentos da Medical no Brasil.
Como segundo chapéu, a questão de talentos ocupa apenas 20% de seu tempo, mas permite que ela converse com os especialistas em recrutamento para falar do programa de trainee da J&J Medical.
“Além de garantir o movimento profissional dos BPs e promover aprendizado constante, o projeto cria uma empatia nos profissionais”, diz Fernando Salinas. Assim, o BP tem consciência do que o especialista faz, o que facilita a relação entre ambos.
Fonte: Revista Você RH, por Tatiana Sendin, 09.09.2015

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