Parece não haver dúvida de que a crise atual será de longa duração. Os analistas do setor automotivo estimam que só em 2024 (!) as vendas de veículos chegarão ao nível de 2012, quando foram vendidos 3,8 milhões de unidades (Venda pode reagir apenas em 2024, Valor, 11/9/2015). Os mais otimistas veem tempos melhores a partir de 2017 ou 2018.
Quando se consideram o enorme tamanho da cadeia produtiva de veículos e a quantidade de empregos que gera, tais previsões são sombrias. A maioria das montadoras já usou todas as alternativas para manter os atuais postos de trabalho (banco de horas, tempo parcial, férias antecipadas, licenças remuneradas, lay off) sem sucesso. Por isso, já demitiram cerca de 30 mil empregados. O reflexo nas empresas de autopeças foi imediato, provocando mais de 50 mil demissões. O impacto sobre seus fornecedores é ainda mais dramático: além das demissões, muitas pequenas empresas estão fechando as portas. E os desdobramentos continuaram, tendo chegado até a ponta da linha: as siderúrgicas enfrentam grandes dificuldades para reter seus empregados.
O encolhimento do emprego foi abrupto. Nos últimos 12 meses, o Brasil destruiu 850 mil postos de trabalho. Deve ultrapassar 1,2 milhão em 2015.
Em 2014, os setores de comércio e serviços ainda atuaram como as locomotivas dos postos de trabalho, tendo criado 217 mil e 587 mil empregos, respectivamente. Nos últimos 12 meses, a indústria de transformação destruiu 435 mil empregos; a construção civil, 357 mil; o comércio, 26 mil; e os serviços, 22 mil postos de trabalho.
A deterioração do quadro de emprego se refletiu nas taxas de desemprego. Nas regiões metropolitanas, estamos com 7,5% de desempregados e no Brasil como um todo, 8,3%, bem acima da taxa registrada em igual período em 2014 (6,8%).
Até o momento, o ajuste no mercado de trabalho vem sendo feito mais pelo lado do emprego do que do salário. O caso mais eloquente é o da indústria de transformação, em que nos últimos 12 meses a força de trabalho encolheu 5% e a folha de pagamento, só 1%. Isso porque no início das recessões as empresas costumam reter os empregados mais qualificados (de salários mais altos), dispensando os menos qualificados (de salários mais baixos).
No primeiro semestre de 2015 houve uma redução de 2% nos rendimentos reais médios dos trabalhadores das regiões metropolitanas. A redução da massa salarial foi de 3% em relação a igual período em 2014. Essa queda, associada ao medo do desemprego, passou a esfriar o consumo, agravando a recessão e forçando a taxa de desemprego para cima.
A retração dos investimentos públicos e privados deve entrar pelos anos de 2016 e 2017. Nesse cenário, as empresas devem continuar dispensando empregados, provocando quedas mais rápidas na massa salarial e no consumo.
Dizem os macroeconomistas que tudo isso será bom para combater a inflação e, assim, recriar o necessário clima de confiança para os investimentos. Mesmo que isso ocorra nos próximos dois anos, tendo a achar que a retomada do emprego virá só no fim de 2017 e 2018. Isso faz antecipar um quadro de muito sofrimento para os próximos dois anos. Concordo com os analistas que a crise será longa. O que fazer, então?
Bom seria se anos atrás o Brasil tivesse feito as benditas reformas estruturais – tributária, previdenciária e trabalhista. Na sua ausência, e com o agravamento do desemprego, não temos saída: o Brasil terá de priorizar a proteção dos mais pobres – os que mais sofrem os impactos da desocupação. Neste momento, não há como ignorar a importância dos programas sociais. Fico assustado com os que impavidamente propõem o fim do Bolsa Família para dar vida ao ajuste fiscal. A lição é simples: os cortes de benefícios terão de incidir sobre os brasileiros de renda mais alta, e não sobre os mais pobres.
(*) Professor da FEA-USP, é presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP e membro da Academia Paulista de Letras.
Fonte: O Estado de São Paulo, por José Pastore (*), 22.09.2015
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