A Lei 8.213/1991, chamada de Lei de Cotas, completa 24 anos nesta sexta-feira, 24. Nasceu para garantir à pessoa com deficiência o direito ao trabalho, principalmente porque, mesmo com todos os avanços neste setor, ainda existem empresários e empresas que consideram o trabalhador com deficiência um problema. Avaliação que ganha força com o veto da presidente Dilma Rousseff (PT), na sanção da Lei Brasileira de Inclusão, à extensão das cotas para pequenas companhias, que empregam de 50 a 99 pessoas.
Aplicar a Lei de Cotas em pequenas empresas representaria um crescimento substancial. Sabemos que conseguir o emprego é somente um entre tantos obstáculos que o trabalhador com deficiência enfrenta. O desafio começa na porta de casa, passa por calçadas sem qualquer condição de uso, chega ao transporte público sem mecanismos de acessibilidade, ao desrespeito a vagas reservadas em estacionamentos e, fundamentalmente, à desvalorização do conhecimento, porque, infelizmente, a subutilização do funcionário com deficiência é uma realidade constante.
Há muitos relatos sobre essa situação. Até mesmo empresas especializadas na colocação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho oferecem vagas que não têm qualquer relação com a formação do candidato. Algo como oferecer a um biólogo o cargo de professor de física quântica, ou perguntar a um gerente comercial se ele teria interesse em trabalhar como piloto de nave espacial.
Em sua justificativa, a presidente afirma que “apesar do mérito da proposta, a medida poderia gerar impacto relevante no setor produtivo, especialmente para empresas de mão-de-obra intensiva de pequeno e médio porte, acarretando dificuldades no seu cumprimento e aplicação de multas que podem inviabilizar empreendimentos de ampla relevância social.”
Para a deputada federal Mara Gabrilli (PSDB/SP), Dilma Rousseff cedeu a “pressões empresariais” derrotadas pela Câmara e pelo Senado por respeito a direitos humanos. “Ao vetar a obrigação de contratação de ao menos um funcionário com deficiência por empresas que têm de 50 a 99 empregados, a presidente diz que se trata de um problema de custos. Neste ato, ela nega a capacidade de trabalho e de produtividade das pessoas com deficiência”, afirma a parlamentar.
Ameaça
O Projeto de Lei º 4.330, de 26 de outubro de 2004, que regula a terceirização no País, ameaça o acesso de pessoas com deficiência ao mercado de trabalho. Aprovado na Câmara, o PL abre brecha para uma flexibilização na Lei de Cotas, porque pode reduzir o número de funcionários diretos de uma empresa e, consequentemente, provocar a queda na quantidade de pessoas com deficiência que devem ser mantidas no quadro funcional.
Exemplo
O artigo nº 93 da Lei de Cotas determina que a “empresa com 100 ou mais funcionários é obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência”. Neste sentido, atualmente uma empresa com 1.001 funcionários precisa ter 5% (50 funcionários) com deficiência. Agora, se esta mesma companhia terceirizar atividades, demitir funcionários diretos e contratar cinco empresas com 150 funcionários cada, ela ficará com 250 empregados diretos. Sendo assim, o percentual de pessoas com deficiência no quadro funcional será de 3%. Ou seja, o número de contratados (com deficiência) cairia de 50 para apenas 8.
“Para que se cumpra efetivamente a Lei de Cotas e haja a real inclusão profissional de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, a empresa deve se ‘reeducar’, ou até mesmo se educar, para receber esse perfil de colaborador”, defende o empresário Marcelo Pires, fundador da Consolidar – Educação Inclusiva nos Negócios, que firmou uma parceria com a Fundação Dorina Nowill para Cegos, para ampliar a conscientização e oferecer soluções que melhorem o processo de contratação de pessoas com deficiência.
Segundo o empresário, essa preparação requer a conscientização de gestores, líderes e colaboradores sobre do universo da pessoa com deficiência “o que chamamos de cultura inclusiva, ou seja, a empresa como um todo deve ser sensibilizada e receber informações sobre a importância de se promover a diversidade humana, enxergando as competências das pessoas com deficiência, antes mesmo de sua deficiência”, diz.
“O Brasil, durante muito tempo, foi um país egoísta, voltado para uma elite que pensava somente em si mesma. Agora, para acelerar, para recuperar o tempo, temos de criar cotas”. A avaliação feita pelo ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, em 2013, quando a Lei de Cotas completou 22 anos, permanece atual. “A nação somente será igual, justa e democrática no dia em que praticar o trabalho decente. E não apenas com um discurso de categorias, do ministério, mas com um discurso de Estado. A incorporação das pessoas com deficiência é indispensável para que o País construa um trabalho decente”, disse o ministro.
Lei de Cotas – O artigo nº 93 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, determina que a “empresa com 100 ou mais funcionários é obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência”, nas proporções:
– de 100 a 200 empregados: 2%
– de 201 a 500 empregados: 3%
– de 501 a 1.000: 4%
– de 1.001 em diante: 5%
A mesma lei estabelece que a “dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 dias, ou sem motivo no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante” e também que “Ministério do Trabalho e Previdência Social devem gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados”.
Fonte: O Estado de São Paulo, por Luiz Alexandre Souza Ventura, 24.07.2015
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