Logo após assumir a presidência do Tribunal Superior do Trabalho, o ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho identificou quatro pontos essenciais para enfrentar a crise que atinge a economia brasileira: modernização trabalhista, valorização da negociação coletiva, celeridade processual e maior uso da conciliação para a solução de conflitos. De fato, são aspectos de extrema importância para retomar o caminho do crescimento e da redução do desemprego, que encerrou 2015 com uma média de 8,5%.
Os elementos citados pelo ministro são comumente apontados pelo setor industrial como desafios a serem enfrentados no Brasil. A desburocratização deve ser considerada, também, fundamental para um novo marco regulatório trabalhista, que privilegie o acordo, a segurança jurídica, a produtividade, a redução de custos e a ampliação da competitividade. Precisamos atentar para os profundos avanços tecnológicos, que modificaram o modo como as economias se organizam e como as atividades são exercidas.
Um dos dados do preocupante quadro atual é o excessivo número de ações trabalhistas: média anual de 8 milhões de processos, entre novos e pendentes de anos anteriores. Isso equivale a 1 demanda ativa para cada 6 trabalhadores formais. É como se toda a população de países como Paraguai, Suécia, Áustria ou Suíça tivesse recorrido ao Poder Judiciário para dirimir questões relacionadas ao trabalho. Esse número não é natural, mas um indicativo claro de que é necessário enfrentar as distorções do sistema com urgência.
É essencial imprimir rapidez às ações em curso. Os brasileiros não podem esperar seis anos, em média, para que um processo se resolva na Justiça Trabalhista. Também é preciso evitar, por meio da instauração de um ambiente de maior cooperação no trabalho, que conflitos judiciais ocorram. Esse ponto encontra resistências, pois exige três mudanças cruciais: modernizar a legislação, prestigiar soluções não judiciais e valorizar a negociação entre empregados e empresas.
A legislação brasileira, que data da década de 1940, considera o trabalhador hipossuficiente, isto é, incapaz de tomar decisões que afetem sua relação com a empresa. Por isso há um excesso de disposições legais tratando de assuntos específicos. Também em razão desse entendimento pouquíssimos acordos extrajudiciais são aceitos. O conceito errôneo em que se baseiam essas restrições é de que apenas a legislação e o Judiciário podem trazer garantias e proteção aos trabalhadores.
Se houve esse risco no passado distante, ele não existe mais. Hoje, diferentemente do que ocorria há 70 anos, trabalho e produção se realizam de diversas maneiras, atendendo a diferentes necessidades sociais. O trabalhador médio tem muito mais informações e condições de buscar seus interesses. E os sindicatos se fortaleceram e ganharam a capacidade de propor mudanças nas condições de trabalho.
Assim, uma legislação que iguala toda a diversidade dos trabalhadores, de Norte a Sul do Brasil, sem se importar com realidades regionais, setoriais e mesmo pessoais, não produz justiça. O que ela faz é impor exigências descabidas que prejudicam empresas e trabalhadores. É preciso equilíbrio na atividade legislativa, na interpretação e na aplicação das leis trabalhistas.
Parcelas do Poder Judiciário e de instituições que lidam com o Direito do Trabalho têm resistido às necessárias reformas, com o argumento de que elas provocariam retrocessos, tornando o trabalho precário. O ministro Ives Gandra Filho, com lucidez, diagnosticou a “ideologização” no debate acerca da proposta de terceirização que tramita no Congresso. Na verdade, esse problema ocorre em quase todo o ambiente trabalhista brasileiro.
É necessário evitar a armadilha ideológica no trato dessas questões e realizar a reforma trabalhista de modo a viabilizar a recuperação da economia e o aumento do emprego. As proteções aos trabalhadores devem ser mantidas, mas é preciso permitir a adoção de acordos que prestigiem o interesse das partes, adaptando as normas às condições de trabalho de cada um. Não estamos mais nos anos 1940. Precisamos nos moldar aos novos tempos.
(*) Robson Braga de Andrade é presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Fonte: O Estado de São Paulo, por Robson Braga de Andrade (*), 15.04.2016
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