O brasileiro é um povo trabalhador. Não tenho dúvida. A grande maioria gasta longas horas para chegar e sair do trabalho, além de trabalhar durante o dia todo e, muitas vezes, à noite. Não são poucos os que têm dois empregos, correndo de um lado para o outro e dispondo de pouco tempo para dedicar à família. Trabalhar faz parte da ética dos brasileiros.
A mesma ética não é encontrada entre dirigentes sindicais. É claro, há exceções. Mas a grande maioria luta por mais e mais licenças e folgas remuneradas. E os parlamentares, também com as devidas exceções, estão sempre dispostos a atender a esses pleitos em busca de votos e apoio político. Ainda recentemente eles aprovaram a inclusão de novas folgas no longo rol de ausências justificadas garantidas por lei. Daqui em diante, os empregados terão dois dias de folga para levar a esposa ao médico durante a gestação (Lei n.º 13.257/2016). A mesma lei aprovou um dia por ano de folga para levar o filho de até seis meses a uma consulta médica.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já garante inúmeras ausências justificadas e remuneradas. A título de exemplo, lembro que os empregados podem faltar dois dias, em caso de luto em família; três dias para se casar; um dia no nascimento de filho; um dia por ano para doar sangue; dois dias para o alistamento eleitoral; o que for necessário para cumprir o serviço militar (com 90 dias remunerados); vários dias para prestar exames vestibulares, para comparecer em juízo e para participar de reunião oficial de organismo sindical internacional, quando se trata de dirigente sindical.
Lembremos que, além das licenças remuneradas, a nossa legislação garante 30 dias de férias a partir do primeiro ano de trabalho e, para bem usufruir esse período, os empregados recebem um terço de seu salário.
Além disso, muitas categorias profissionais, por força de lei, têm jornadas bem mais curtas do que a estabelecida na Constituição federal, que é de 8 horas diárias. Por exemplo, os bancários, engenheiros e ascensoristas trabalham apenas 6 horas por dia; os jornalistas, radialistas e operadores cinematográficos, 5 horas; os médicos e advogados, 4 horas.
Reconheço o alcance humano das licenças remuneradas. Indago, porém, se todos esses dias de folga podem ser gozados sem que isso onere o custo de produção e os preços a serem pagos pela sociedade e pelos próprios empregados. A resposta é negativa. É claro que nem todo empregado usufrui dessas folgas todos os anos. Mas, quando se leva em conta a força de trabalho, os empregadores têm de contar com essas ausências, pois são todas remuneradas e exigem substituição.
O leitor ficará surpreso com a grande quantidade de projetos de lei que aumentam ainda mais o número de folgas e que reduzem as jornadas de trabalho. Convenhamos, fica muito caro para um país produzir de forma competitiva quando se exagera na ociosidade. Domenico de Masi se notabilizou com suas propostas a respeito da economia do futuro, em que as pessoas trabalharão cada vez menos, podendo usufruir das belezas das artes e da cultura em geral. Mas isso está bem longe do Brasil.
Vivemos um tempo em que o trabalho precisa ser valorizado e realizado com o máximo de eficiência. Tenho certeza de que os brasileiros estão imbuídos disso. Resta, agora, convencer os dirigentes sindicais e os parlamentares que ainda insistem em soluções populistas para preservar seu poder.
Para sair da crise atual, é certo que todos nós teremos de trabalhar mais e com mais produtividade. Aliás, essa seria a contribuição dos cidadãos num eventual pacto social em que os agentes sociais têm de entrar com sacrifícios para retomar o caminho do crescimento. A cultura do ócio no Brasil.
(*) José Pastore é professor da FEA-USP, é presidente do conselho de emprego e relações do trabalho da FECOMERCIO-SP e membro da academia paulista de letras
Fonte: O Estado de São Paulo, por José Pastore, 05.04.2016
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