O pensamento dogmático, sectário, costuma resultar em violência. No universo das religiões, há os dramáticos exemplos de barbáries cometidas por frações do Islã radical, em várias partes do mundo. No Brasil e também em outros países, este tipo de fé religiosa cega, importada por grupos político-ideológicos, também obstrui aperfeiçoamentos legais favoráveis aos trabalhadores como um todo, mas denunciados como demoníacos ataques a alegados direitos trabalhistas.
A discussão que se arrasta há mais de década sobre o arcaísmo da legislação trabalhista brasileira volta a ganhar força no governo do presidente interino Michel Temer, obrigado a manejar com a maior crise econômica de que se tem notícia na história republicana do país.
Com já mais de 10 milhões de desempregados, devido à recessão deflagrada pela irresponsabilidade fiscal de Lula e Dilma, o país vê serem destruídas conquistas sociais tão alardeadas de palanques eleitorais.
Com quedas históricas do PIB, ao nível de 3% ao ano, a economia desemprega e, com isso, diminui a circulação de renda, reduz a coleta de impostos e agrava a crise fiscal do Estado. É vital romper esta cadeia de sucessão de desastres.
É por isso que, independentemente de várias medidas no campo macroeconômico, tudo o que tornar menos onerosa a criação de empregos é bem-vindo. Para ajudar a ampliar o mercado de trabalho, em velocidade mais alta na retomada do crescimento, e a fim de atenuar o impacto recessivo do desemprego no desaquecimento prolongado da economia.
Daí ser crucial a reforma trabalhista no conjunto de medidas que Temer se prepara para enviar ao Congresso — tudo indica, depois de aprovado o impeachment.
Neste campo, há uma medida-chave, mas não a única: aceitar o “negociado” por sobre o “legislado”. Quer dizer, se patrões e empregados, via sindicatos, aceitarem contrariar alguma norma da arcaica Consolidação das Lei dos Trabalho — a getuliana CLT, da década de 40 —, para manter e/ou criar empregos, a Justiça do Trabalho sancionará o entendimento.
É o que fez o próprio governo Dilma, no segundo mandato, quando a crise mostrou a cara, pulverizando empregos aos milhares. Ela, numa heresia, adotou o conceito do “negociado” em vez do “legislado”, demonizado pela CUT, e lançou o Programa de Proteção ao Emprego. Por ele, jornada e salário podem ser reduzidos em 30%, para manter empregos. Mas o adotou de forma acanhada, parcial.
O mesmo aperfeiçoamento é tentado na reforma trabalhista do governo socialista francês, por exemplo. A reação sindical é idêntica à da CUT. Não se quer saber quantos empregos podem ser mantidos, mesmo com salários mais baixos. Pesa mais o sectarismo ideológico.
Na indústria automobilística brasileira ainda há, segundo a entidade das montadoras (Anfavea), 32 mil metalúrgicos a mais nas linhas de montagem, depois de todas as demissões. Afinal, hoje as vendas caem no mercado interno à razão de 25% ao ano.
O que fazer com eles? Já existem 21,3 mil sob o regime do PPE (menor carga de trabalho, salário mais baixo pago pela empresa). Ao contrário do que pensam mentes conspiratórias, não interessa às fábricas demitir operários. O melhor é manter o maior número possível deles, à espera da retomada do crescimento, sem necessitar fazer contratação de gente sem treinamento. Mas, dentro das regras de uma CLT feita para um Brasil ainda rural, com indústria e mercado de trabalho incipientes, nada feito. Em nome da “garantia de direitos”, incentivam-se as demissões.
Fonte: O Globo, 17.07.2016
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