Tribunais regionais em todo o país ameaçam fechar as portas a partir de agosto por conta dos cortes de 30% nas despesas para manutenção e de 90% nos recursos para investimentos.
Em um país que contabiliza 11 milhões de desempregados e a tramitação de 3 milhões de novos processos judiciais a cada ano, a Justiça do Trabalho é que pede socorro. Diante de um corte orçamentário de 30% nas despesas de custeio e de 90% na verba para investimentos, tribunais trabalhistas ameaçam não funcionar a partir do mês que vem. Entidades representantes da categoria alegam que para fechar as contas dos 24 tribunais regionais do Trabalho (TRTs) no Brasil até o fim deste ano seriam necessários pelo menos mais R$ 250 milhões.
Em abril, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, já havia feito o alerta ao afirmar que os efeitos da crise econômica e política do país fariam com que a Justiça trabalhista cruzasse os braços. Segundo ele, além de cortes no orçamento que reduziram recursos para manutenção e investimentos em sistemas eletrônicos da Corte, o crescimento das demissões no país aumentou o número de ações em tramitação na Justiça do Trabalho.
A redução orçamentária já levou a uma série de cortes de gastos e mudanças no horário de funcionamento e atendimento ao público no Distrito Federal e em estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro, Tocantins, Rondônia e Acre. Ainda assim, a economia gerada com as medidas não foi suficiente para evitar o prejuízo para o cidadão. O primeiro a fechar as portas, ainda este mês, pode ser o TRT da 15ª Região, sediado em Campinas, que sofreu corte de R$ 49 milhões em suas contas.
O órgão é responsável pelas ações envolvendo patrões e empregados de 599 cidades paulistas, onde vivem 11 milhões de pessoas. A jornada foi mantida, mas o horário de atendimento ao público acabou antecipado para economizar energia, das 11h às 17h. Recentemente, o presidente do TRT-15, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, afirmou que há o risco de uma pane no sistema e “reza todos os dias” para evitar a paralisação. Ainda não se sabe se as orações surtirão o efeito esperado.
No mês que vem, tribunais de São Paulo e Acre ameaçam parar. Maior do país, o tribunal paulista teve que se adaptar a um corte de R$ 95 milhões. A duração do expediente foi mantida, mas o órgão renegociou contratos, reduziu o uso de ar-condicionado e elevadores e cortou investimentos. Documento administrativo foi encaminhado à direção do TRT com um diagnóstico da grave situação financeira do órgão. Nele, teria a orientação para parar o funcionamento a partir de 1º de agosto.
A informação não foi confirmada pela assessoria de imprensa do TRT de São Paulo. Em carta aberta divulgada na sexta-feira, a presidente do órgão, Silvia Regina Pondé Galvão Devonald, disse que a “hipótese só se efetivará se não conseguirmos vencer a crise orçamentária”. “Quero tranquilizar a população e a Ordem dos Advogados do Brasil, garantindo-lhes que o desempenho de nosso dever constitucional é desejo único e sempre será priorizado”, continua a carta.
Valor da bolsa
Durante um ato público em defesa da valorização da Justiça laboral em 17 de junho, o presidente do TRT do Acre, desembargador Francisco Cruz, deixou claro que o funcionamento do órgão está comprometido com a redução do orçamento. Algumas medidas de economia já estão sendo tomadas, como a alteração do horário de funcionamento, que passou a ser das 7h30 às 14h30 para reduzir o consumo de energia.
A direção do TRT do Pará já anunciou que os recursos acabarão em setembro, apesar de ter adotado medidas como a redução do número de estagiários, diminuição do valor da bolsa e encerramento do expediente às 16h. Também foi paralisada a construção de um prédio que sediaria todas as varas do trabalho de Belém, além da Escola Judiciário. Durante um ato realizado em 24 de maio, a direção do TRT pernambucano alertou para a crise financeira com o corte de R$ 17 milhões, e o risco de paralisar as atividades em setembro.
Coleta de assinaturas
O corte no orçamento do Judiciário federal foi promovido ainda no governo Dilma Rousseff (PT), como forma de conter os gastos públicos. Mas representantes da Justiça do Trabalho reclamam de tratamento discriminatório, pois o percentual na área foi maior que nos demais: 90% nos investimentos pedidos e 30% nas verbas de custeio. Os demais ramos do Judiciário tiveram cortes de 40% e 15% nas duas áreas. Da previsão inicial de R$ 1,86 bilhão, o orçamento caiu para R$ 1,2 bilhão.
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) até tentou, na Justiça, reverter o corte. Mas não obteve sucesso. Ao julgar a ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela entidade, sete dos 10 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) opinaram que o Judiciário não pode interferir nas opções do Legislativo na destinação de recursos, especialmente num momento de crise. Em defesa do orçamento aprovado no Congresso, a Advocacia-Geral da União (AGU) argumentou que os parlamentares agiram dentro da competência ao promover os cortes, que atingiram toda a administração pública.
Diante do cenário, a Anamatra encabeçou um movimento em defesa dos tribunais trabalhistas. Até a sexta-feira passada, a entidade já contabilizava 1.838 assinaturas de ministros, desembargadores, juízes, advogados e membros da sociedade civil em um documento em repúdio à medida. (IS)
Fonte: Correio Braziliense, por Isabella Souto, 11.07.2016
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