Um dos temas que na atualidade enseja acirrados debates no âmbito do Direito do Trabalho é a terceirização de serviços e o critério adequado para sua regulamentação. Sabemos que a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho elegeu como lícita a terceirização no que denomina de “atividade-meio”, a teor do inciso III da referida súmula, desde que ausentes a pessoalidade e a subordinação direta, em oposição à possibilidade de terceirização da “atividade-fim” do tomador de serviços.
É bom lembrar que o TST viu-se forçado a regulamentar a terceirização através de sua jurisprudência pela ausência de regulamentação legal do fenômeno pelo Poder Legislativo, a quem cumpria editar norma regulamentadora, de modo a criar parâmetros seguros na aplicação do instituto, evitando excessos no trato do fenômeno, mas que até esta data não logrou fazê-lo.
Assim, editou o TST, em 1986, o Enunciado 256, que já cogitava da limitação da terceirização à atividade meio, vedando a interposição lícita de empresa terceirizada no caso de atividade fim do tomador de serviços. E este tem sido o critério, mantido pela Súmula 331, editada em 1993, que substituiu o enunciado referido.
Acreditamos que à época da edição do Enunciado 256 o critério distintivo entre atividade meio e atividade fim serviu como bom parâmetro por algum tempo, mas hoje mostra-se ultrapassado e inadequado, gerando excessos de ambos os lados que tratam a questão. Alguns setores do empresariado pretendem a validade da terceirização em todas as atividades, como resulta do PL 4.330, que embora aprovado na Câmara Federal, está paralisado no Senado Federal, exatamente pelo reflexo que causará nas relações de trabalho e que enseja reação contrária a sua aprovação. De outra parte, os trabalhadores buscam banir a terceirização do universo jurídico, pela possibilidade de precarização das condições de trabalho. A Súmula 331, III, do TST estabelece entre nós, atualmente, a regra para licitude da terceirização, dispondo:
“Súmula 331- III. Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102, de 20 de junho de 1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade – meio do tomador dos serviços, desde que inexista a pessoalidade e a subordinação direta.”
Vemos, portanto, que a regra aplicável limita a terceirização à atividade meio, impossibilitando outras atividades de virem a ser objeto de terceirização, a despeito de se tratar de atividades especializadas. O Projeto de Lei 4.330-I, de 2004, aprovado na Câmara dos Deputados, dispõe em seu artigo 4º:
“Art. 4º. É lícito o contrato de terceirização relacionado a parcela de qualquer atividade da contratante que obedeça aos requisitos previstos nesta Lei, não se configurando vínculo de emprego entre a contratante e os empregados da contratada, exceto se verificados os requisitos previstos nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.”
Possibilita o projeto a terceirização em qualquer atividade, o que significa que há evidente conflito entre as duas regras em comento, pois para o TST só é lícita a terceirização em se tratando de atividade meio, enquanto que o projeto de lei autoriza a terceirização em qualquer atividade, residindo aí um dos motivos da paralisação do processo legislativo de análise do PL 4330 no Senado Federal.
A prática da terceirização é uma realidade entre nós, daí porque é premente a sua regulamentação adequada, a fim de buscar a normalidade nas relações trabalhistas .
Surge, pois, a questão relativa a fixar o melhor critério para regulamentação da terceirização: deve ser permitida também na atividade-fim, como propõe o PL 4.330; deve ser permitida apenas na atividade-meio, como determina a súmula 331 do TST; devemos condicionar sua validade à especialização, tanto na atividade meio quanto na atividade fim, ou, ainda, devemos permitir condicionada à gerência da atividade desenvolvida pelo prestador de serviços, por exemplo ?
Sabemos que enquanto o PL 4.330 aguarda apreciação pelo Senado Federal, há no Supremo Tribunal Federal uma ação judicial que questiona a constitucionalidade da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, mas nenhum dos dois poderes decide, talvez um aguardando o posicionamento do outro.
Tal situação estimula que o tema seja objeto de reflexões por todos os setores envolvidos com as relações de trabalho, e acreditamos que o próprio Tribunal Superior do Trabalho poderá em breve propor outro critério, alterando a Súmula 331. Cumpre aguardar o desenvolvimento desta polêmica, com a adoção de um novo posicionamento, augurando que seja este capaz de melhor equacionar a questão.
(*) Pedro Paulo Teixeira Manus é ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho, professor e diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, por Pedro Paulo Teixeira Manus (*), 01.07.2016
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