As políticas de inovação e/ou de melhoria de produtos e processos no chão-de-fábrica das empresas colocam, no seu centro de preocupações, o elemento humano. E por motivo justo. Quem opera intelectualmente para desenvolver ou aperfeiçoar alguma tecnologia é o homem – seja empregado, terceirizado, parceiro ou mesmo sócio. Além disso, quem inventa tem seus direitos assegurados e reconhecidos, tanto aos olhos da Consolidação das Leis do Trabalho como de legislações específicas que regem a inovação. Logo, inovação gera frutos ao agente.
Vejamos o caso de um programador contratado no regime da CLT. O software/atualização desenvolvido, no dia a dia, para seu empregador, é remunerado via salário. Assim, salvo estipulado em contrário, pertencem exclusivamente ao empregador todo e qualquer direito sobre programas de computador desenvolvidos pelo empregado na vigência do Contrato de Trabalho. A previsão consta no artigo 4º da Lei 9.609/98 – que disciplina a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua comercialização no país e dá outras providências. Em síntese: nesta hipótese, o empregado é pago para inovar para o empregador.
Diferente é a situação do empregado que, sem ser pago para isso, cria tecnologia para facilitar o seu próprio trabalho, beneficiando a empresa. Foi o que aconteceu, recentemente, com um operário gaúcho que trabalhou numa distribuidora de gás sediada em Passo Fundo. Ele ganhou R$ 50 mil, a título de indenização na Justiça do Trabalho, depois de ter sido reconhecido como o criador de uma ‘‘lança transportadora de carga e descarga’’.
Os juízes se convenceram de que o seu invento é dotado de requisitos legais que lhe atribuem direitos autorais ou indenização. Afinal de contas, o equipamento não só aumentou os lucros da empresa como, também, evitou danos à saúde dos trabalhadores, pois reduziu as possibilidades de ações e indenizações decorrentes de doenças ocupacionais ou acidentes do trabalho.
Neste caso, os julgadores se basearam no conceito de ‘‘modelo de utilidade’’ para fins de patente, presente no artigo 9º da Lei de Propriedade Industrial (9.279/1996). O artigo 91, caput, da mesma lei, diz que “a propriedade de invenção ou de modelo de utilidade será comum, em partes iguais, quando resultar da contribuição pessoal do empregado e de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, ressalvada expressa disposição contratual em contrário”.
Às vezes, a ingratidão ou a falta de reconhecimento resulta mais caro ao empregador. Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho mandou a Petrobras pagar, por 20 anos, a terça parte de 50% de todo e qualquer benefício auferido pela tecnologia desenvolvida por um engenheiro mecânico que deixou a companhia em 2000. A tecnologia – desenvolvida por ele e mais dois empregados – acabou registrada pela estatal. O prazo, que reflete a vigência da patente, está previsto no artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial.
Durante a apreciação do recurso na corte superior, o ministro-relator do caso, Augusto César de Carvalho, explicou que a chamada ‘‘invenção de serviço’’ – amparada em Contrato de Trabalho — realmente não dá direito à criação, que pertence apenas à empresa. No entanto, no caso dos autos, o invento foi viabilizado graças à contribuição pessoal do empregado-reclamante. Este, com seu esforço e utilizando recursos, dados, meios, materiais, instalações e equipamentos do empregador, deu vida á tecnologia. Logo, tem direito à ‘‘justa remuneração’’.
Assim, as empresas que necessitam de constante renovação tecnológica para sobreviver no mercado, especialmente, não podem tratar os empregados inovadores como outro qualquer, deixando de incluir cláusulas específicas para regular os direitos de propriedade intelectual no Contrato de Trabalho. Desconsiderar este cuidado básico pode gerar dúvida sobre a real titularidade do direito patentário, além de produzir passivo trabalhista, se o empregado vier a reclamar seus direitos na Justiça.
(*) Luciano Becker de Souza Soares é especialista em Propriedade Intelectual e Direito Tributário e sócio do Cesar Peres Advocacia Empresarial (CPAE).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, por Luciano Becker de Souza Soares, 29.06.2016
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