Diversas pesquisas vêm mostrando, na última década, que CEOs ao redor do mundo enxergam o capital humano como um de seus principais desafios- tão ou mais importante que o capital financeiro ou a excelência operacional. O mercado reconhece que dificilmente uma organização conseguirá ser inovadora, ter boa reputação e estar próxima dos clientes se não fizer uma abordagem correta na gestão de pessoas.
Faz um bom tempo que os profissionais de recursos humanos passaram também a ganhar novo status dentro das corporações, contribuindo mais fortemente para a estratégia do negócio. Uma perspectiva interessante é que, diante deste cenário, abre espaço para que posições de CEO comecem a ser ocupadas por profissionais com formação em RH. Esse assunto surgiu em um evento do qual participei e é uma discussão que sempre me deixa animada, porque é um sonho antigo meu ver esse movimento acontecer nas empresas.
Existe um entendimento claro entre os pensadores deste tema de que, hoje em dia, RH não deveria envolver apenas funcionários e um olhar interno, mas sim todas as relações que a empresa mantém com as pessoas, sejam elas de dentro de casa ou de fora. Ele tem que compreender o novo perfil dos trabalhadores e, adicionalmente, interpretar o impacto da tecnologia na sociedade, as transformações sociais, políticas e geoeconômicas.
Enquanto as relações estão se tornando cada vez mais complexas, dentro de uma sociedade igualmente complexa, o papel do RH transcende o escopo até então delimitado e alcança novas esferas.
O profissional com background em RH teria, em tese, a capacidade de trazer para a mesa de CEO questões que todos dizem ser intangíveis, mas que são transformadoras do negócio. Ele conseguiria compreender, como poucos, qual é a alavanca e a dinâmica que a empresa terá a partir das relações com os diferentes públicos. Em suma, faz todo sentido que essa visão seja incorporada ao papel dos CEOs.
Existe uma demanda latente por um líder que saiba tratar da estratégia e interpretar os números sem deixar de lado um olhar que carrega consigo conhecimentos de antropologia, de sociologia, de transformações sociais. Não tenho dúvida de que o ambiente corporativo será muito mais ético, humano e sustentável se tivermos CEOs capazes de fazer essa leitura.
Mas, apesar de fazer todo sentido na teoria, essa possibilidade traz consigo uma pergunta crucial: será que os executivos de RH estão preparados para se tornarem presidentes de empresas?
Não me refiro apenas ao preparo técnico, como a necessidade de entender de finanças, de gestão de negócios, de risco, de planejamento – que são pré-requisitos para a função. Estou falando, também, sobre o entendimento da profundidade desse momento que a nossa sociedade está vivendo. Vemos, ainda, profissionais perdidos e presos ao passado, apanhando para solucionar questões simples e trazendo as mesmas soluções de 20 anos atrás.
Em tempos de crise como este, me dá uma profunda tristeza ver como as organizações têm lidado com os processos de demissão, por exemplo. Nada tem a ver com ser bonzinho, mas sim de procurar engajar as pessoas, de promover acolhimento, de se preocupar com o ambiente, de demonstrar respeito nas relações e de dar condições para as pessoas desligadas retornarem ativas ao mercado em um curto espaço de tempo.
Que legado os executivos no comando dessas empresas estão deixando? Onde estão os profissionais de RH para mostrar que o mundo mudou e que não existe propósito sem respeito a todos os indivíduos?
Acho que os RHs que conseguirem encontrar esse espaço estarão dando um importante passo para se tornarem grandes presidentes no futuro. E como chegar lá? Estudando, provocando, pensando em novas soluções, tentando entender de forma profunda as transformações que estão ocorrendo. Dessa forma, fará todo sentido o RH sentar na cabeceira.
(*) Vicky Bloch é professora da FGV, do MBA de recursos humanos da FIA e fundadora da Vicky Bloch Associados.
Fonte: Valor Econômico, por Vicky Bloch (*), 19.05.2016
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