sexta-feira, 27 de maio de 2016

Empregados ou motoristas autônomos – Mais uma polêmica envolvendo o Uber.

Desde que iniciou suas atividades no Brasil, o aplicativo de transporte privado Uber tem sido alvo de inúmeras polêmicas e controvérsias. As principais delas sempre ligadas aos taxistas, em razão da concorrência direta.
Nos Estados, a liberação do serviço também tem gerado discussões calorosas e, nos casos em que houve autorização, objeto de regulamentação.
A legalidade da atividade e suas possíveis limitações decorrentes das regulações, entretanto, não são os únicos pontos de discussão envolvendo a multinacional americana. É tema de debate atual a relação existente entre os motoristas do Uber e a empresa, se empregatícia ou de prestação de serviços autônomos.
A discussão foi inflamada após a decisão da Comissão de Trabalho do Estado da Califórnia (California Labor Commission’s) que concluiu, administrativamente, que uma motorista do Uber seria empregada da empresa, e não uma prestadora de serviço autônoma.
Um juiz federal da Corte do Distrito Norte da Califórnia (United States District Court of the Northern District of California) admitiu uma ação contra o Uber, dando a ela o status de ação coletiva. No caso, três motoristas buscavam o reconhecimento da condição de funcionários (empregados) e não prestadores de serviço.
É importante deixar claro que a legislação trabalhista americana é diferente da brasileira e, por isso, o resultado de qualquer decisão proferida pela Justiça estrangeira, seja ele qual for, embora gere inevitáveis comparações e discussões sobre possíveis reflexos no Brasil, deve ser visto com cautela e ressalvas.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) define em seu artigo 3º o conceito de empregado como sendo “toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”. Em outras palavras, para haver vínculo empregatício, é necessária a presença dos seguintes requisitos: pessoalidade, onerosidade, habitualidade e subordinação. Este último, via de regra, é o fiel da balança.
Para os que defendem a possibilidade de reconhecimento de vínculo empregatício dos motoristas com a Uber, os principais fundamentos são de que a empresa é quem controla o preço das corridas, o padrão de atendimento, a forma de pagamento. Além disso, é o Uber quem recebe e paga os motoristas, faz avaliação do atendimento, podendo descredenciá-los a qualquer tempo. Aqui estaria caracterizada a subordinação.
Segundo seu site, Uber é uma empresa de tecnologia que se utiliza de uma plataforma ou aplicativo de smartfones para conectar motoristas a passageiros. Pelo seu modelo de negócios, não emprega motoristas e não possui frota. Seu principal atrativo, sob a ótica de quem prestará o serviço – motorista – é a total liberdade de trabalhar quando quiser e pelo tempo que quiser. Essa característica da relação é que retiraria a subordinação.
A avaliação é uma via de mão dupla, já que o passageiro avalia o motorista e este avalia o passageiro. Isso se deve a um controle de qualidade proposto pela Uber, próprio de vários outros modelos de negócios e que não atrai, por si só e necessariamente, a subordinação exigida para o vínculo empregatício. Exemplo disso são as franquias, que na maioria das vezes exercem rigoroso controle de padrão e qualidade em relação e seus franqueados, que se não observados podem ter seus contratos rescindidos. Nem por isso há relação de emprego entre franqueado e franqueador.
Também não há vínculo de emprego, mas verdadeira prestação de serviço autônomo, na relação entre taxistas e empresas de rádio táxi ou entre taxistas e permissionários, segundo várias decisões da Justiça do Trabalho brasileira.
Há um projeto de Lei atualmente na Secretaria Legislativa do Senado Federal, de autoria do Senador Ricardo Ferraço do PSDB/SC, que visa alterar a Lei 12.587/2012 e regulamentar e organizar o sistema de transporte privado individual a partir de provedores de rede de compartilhamento, dentre eles o Uber, havendo proposição de definição do “motorista parceiro”, que segundo o texto inicial é o “empreendedor que disponibiliza a opção do compartilhamento, podendo ser de sua propriedade ou de outrem, através de locação de veículo por curto período de tempo, e o faz pelo viés de Provedor de Rede de Compartilhamento estruturado a partir de Rede Digital” e que “deverão estar enquadrados nas figuras jurídicas do Microempreendedor Individual (MEI) ou no Simples Nacional como requisito para ingresso na plataforma”, o que reforça a ideia de que não há relação empregatícia.
Relevante ressaltar que a Justiça Trabalhista no Brasil tem como um de seus pilares de sustentação a Primazia da Realidade, e que eventuais fraudes na contratação de motoristas pela empresa Uber (ou qualquer outra) estão sujeitas a análise casuística, podendo haver, sim, o reconhecimento do vínculo de emprego.
Fonte: JOTA, por Carlos Vinicius Duarte Amorim, 05.05.2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário