Como aconteceu com muitas empresas durante a crise financeira de 2008, uma fornecedora de serviços de terceirização baseada na Índia precisou realizar amplos cortes de custos. Prevendo que seus clientes passariam pela mesma dificuldade – e, como consequência, poderiam deixar de usar seus serviços – o CEO deu aos funcionários uma missão: eles deveriam pensar em estratégias que reduzissem despesas para seus clientes. Como resultado, as empresas não só mantiveram todos os contratos como buscaram mais serviços da companhia quando a economia melhorou. No fim, a empresa não precisou fazer nenhum corte.
Esse exemplo é dado pela professora da Harvard Business School, Linda Hill, quando questionada sobre o que líderes podem fazer para engajar funcionários durante períodos de crise, sem deixar de inovar ou se preparar para a retomada do mercado. “O que o CEO dessa empresa indiana fez foi dizer para os funcionários pegarem toda a energia que estava sendo gasta com o medo de perder o emprego e aplicá-la em entender as necessidades dos clientes. Fazendo isso, todos conseguiriam manter seus trabalhos”, diz Linda.
Especialista em liderança, a americana é coautora dos livros “Collective Genius”, que estudou equipes de empresas altamente inovadoras, e “Being the Boss”, sobre liderança. Em suas palavras, o foco de suas pesquisas é como executivos podem inspirar suas equipes a fazer aquilo que pode ser feito – em oposição a apenas aquilo que deve ser feito.
Uma grande lição que ela ilustra com o caso do CEO indiano foi a aproximação do profissional com o resto da empresa. “Ele estava extremamente presente durante todo o processo, e se tornou mais disponível por meio de blogs e encontros com os funcionários”, explica. Para ela, a conexão emocional entre líderes e suas equipes é uma das habilidades mais importantes em um momento de dificuldade, algo que pode ficar esquecido quando a pressão por resultados é crescente.
Liderar, diz a acadêmica, é usar a si mesmo como um instrumento. “Você precisa pensar em qual a experiência que as pessoas terão em relação a você”, diz. No mesmo exemplo da empresa indiana, o CEO passou a abrir mais os resultados financeiros da organização para os funcionários. No início, houve receio de que as informações vazassem para concorrentes, mas a temor se mostrou infundado. “Não houve vazamentos porque as pessoas sabiam que isso prejudicaria seus empregos. Elas consideraram o líder digno de confiança, pois ele estava compartilhando aquelas informações”, diz.
A relação entre o CEO e o resto da empresa foi essencial para garantir o engajamento. “Fundamentalmente, se você quer ser um líder efetivo, precisa se preocupar com conexões emocionais”, diz Linda. Para conquistar a confiança de alguém, competência não é suficiente, pois as pessoas também estarão de olho em seu caráter. “Em um período de crise, as pessoas prestarão mais atenção naquilo que você diz, pois elas estão inseguras. Você descobre realmente a qualidade dos líderes durante momentos de dificuldade”, diz a professora.
Comunicar a estratégia e os desafios da empresa com transparência, bem como ajudar os funcionários a entenderem melhor o contexto geral do mercado são tarefas tradicionais dos líderes que se tornam ainda mais importantes durante crises. “Também é relevante ajudar as pessoas a serem realistas – nem ingênuas nem cínicas – em relação à situação delas. Por isso, faz muita diferença que as pessoas saibam o contexto inteiro. Do contrário, algumas decisões parecerão arbitrárias”, diz.
Para a acadêmica, o grande desafio de um período de recessão é equilibrar a redução de custos com investimentos que ajudem os serviços e produtos a se destacarem durante a crise e após a retomada da economia. A mesma lição serve para a relação com os funcionários. “Se você não trata seus empregados bem, assim que a economia melhora e outras oportunidades surgem, eles deixam a empresa”, diz. Linda esteve no Brasil no início do segundo semestre deste ano, quando percebeu um movimento de algumas companhias para ampliar investimentos em treinamento e desenvolvimento de liderança, justamente com esse objetivo.
Embora a palavra inovação muitas vezes pareça perder o sentido em um período de dificuldades, quando as empresas ficam mais avessas ao risco, Linda reforça que desenvolver novas ideias e melhorar processos podem ser ações inovadoras com intenção de diminuir custos.
Em seu livro “Collective Genius”, ela observou como líderes de equipes altamente criativas – em empresas como o estúdio de animação Pixar – conseguem gerar inovação. “Essas pessoas são visionárias, mas sua força está em compreender que sua capacidade de inovar está limitada à sua imaginação. Nós sabemos que a inovação vem do trabalho colaborativo entre pessoas com pontos de vistas e origens diferentes”, diz. O que garante o sucesso desses times, diz ela, é trabalhar o ambiente, ao invés de apresentar uma visão e convencer os outros a segui-la.
Esses líderes conseguem criar uma cultura que permite à inovação aflorar em um ambiente caracterizado por um senso de comunidade forte, mas onde todos têm a liberdade de contestar uns aos outros. “Você precisa poder questionar qualquer coisa. Para isso, o segredo é tornar as pessoas boas ouvintes e capazes de defender o próprio ponto de vista.”
Fonte: Valor Econômico, por Letícia Arcoverde, 23.11.2015
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