domingo, 23 de agosto de 2015

Quando não há recursos é preciso ser mais criativo.

A especialista em recursos humanos Anna Tavis tem bastante experiência sobre como gerir pessoas em momentos de crise. Ela era a vice-presidente da área de RH quando a seguradora americana AIG quase faliu durante a crise financeira de 2008. “É um momento difícil, mas é quando a área de gestão de pessoas precisa pensar em inovação”, diz.
Nascida na Rússia, a consultora e coach possui experiência internacional e dá aulas de gestão organizacional na Universidade de Nova York. Ela dará palestra hoje no Conarh, evento de gestão de pessoas que acontece o longo desta semana, em São Paulo.
Em conversa por telefone com o Valor, Anna disse que espera trazer uma mensagem positiva para os colegas brasileiros. “Eles precisam saber que não estão sozinhos. Todos nós já passamos por situações parecidas. A crise é precursora de coisas melhores.” Para ela, a inovação surge justamente em momentos críticos como o que o país vive. “É quando os recursos dos tempos de bonança não estão mais disponíveis que você precisa ser criativo e fazer as coisas de um jeito diferente”, enfatiza.
Em tempos em que corte de custos e busca por mais resultados dominam os discursos das empresas, Anna defende que o RH deve encontrar maneiras de atuar junto aos funcionários sem aumentar despesas ou investimentos. Algumas alternativas são transformar profissionais da própria empresa em coaches, incentivar o networking e providenciar ferramentas para que pessoas demitidas consigam encontrar um novo trabalho ou abrir o próprio negócio.
“Transmitir a mensagem de que a empresa se importa e está comprometida com os funcionários trará diversos benefícios no futuro”, explica, citando como exemplos a melhoria da reputação externa da empresa e a capacidade de contratar bons profissionais novamente quando a crise passar.
Em sua opinião, os gestores têm papel fundamental nesse ambiente e, além de se manterem visíveis, precisam passar confiança aos funcionários e construir um senso de comunidade dentro da empresa. “O alto escalão não pode se isolar do resto dos trabalhadores quando não consegue encarar os desafios”, afirma Anna. Isso não inclui, porém, apenas aqueles que ocupam oficialmente posições de comando. “Os líderes são as pessoas que vão à luta, e vão aparecer em todos os níveis da organização. O RH pode assumir esse papel ao se comunicar intensamente com o resto da companhia.”
Quando estava na AIG, uma de suas iniciativas para lidar com a crise financeira foi criar uma rede de contatos com outros profissionais de RH do mercado financeiro. O grupo se encontrava para trocar experiências e discutir as práticas e as soluções encontradas em suas empresas – mas tudo isso após passar por um primeiro estágio, em que podiam desabafar e reclamar à vontade.
De acordo com Anna, em organizações que estão passando por momentos de crises internas, como as envolvidas na Operação Lava-Jato, essa fase inicial também é importante e deve ser encorajada e organizada pelo RH. “Colocar uma fachada na crise e fingir que está tudo bem pode parecer positivo, mas isso apenas vai piorar a situação. O RH pode criar oportunidades estruturadas para as pessoas se expressarem e liderar as conversas em todos os níveis”, diz.
Para ela, em momentos de turbulência, o RH tem o papel de continuar a investir em uma cultura organizacional que incentive o crescimento. “Não há nada pior do que deixar sua cultura de lado e perder a confiança das pessoas. Isso é muito difícil de reconstruir. As empresas precisam se preocupar com o longo prazo e não apenas com o presente.”
Olhar para o futuro é a missão que o RH precisa abraçar com mais força, segundo Anna. “Para que as companhias se tornem sustentáveis e tenham sucesso, elas vão precisar se aventurar em novos negócios”, diz. A sobrevivência das empresas hoje depende da capacidade não só de expandir e crescer em atividades que elas dominem, mas em áreas e negócios em que nunca trabalharam antes. “Os profissionais de RH precisam ser consultores e conselheiros nesse contexto”, diz.
O desafio está em saber que tipo de pessoas se tornarão líderes ou as habilidades necessárias para que a empresa tenha sucesso em um negócio que nunca foi feito antes. “Nosso sistema educacional e nosso modelo de competências se baseiam em legados, na ideia de que o que funcionou antes vai funcionar de novo, e isso não é mais o caso”, diz.
Para ela, isso se traduz no RH ser capaz de desenvolver habilidades como agilidade, tomada de decisão e gestão de riscos. “Essa área sempre foi avessa ao risco e focada em seguir as regras. Hoje, no entanto, é preciso saber tomar decisões com poucas informações disponíveis”, diz.
Fonte: Valor Econômico, por Letícia Arcoverde, 19.08.2015

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