O juiz Léverson Bastos Dutra, na titularidade da 4ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora-MG, julgou improcedente o pedido de cobrança de imposto sindical formulado por um sindicato patronal do comércio em face de uma administradora de imóveis. Ele esclareceu que, de acordo com o objeto social da empresa, não seria possível enquadrá-la ao sindicato autor, já que afeta a outro sindicato patronal. E frisou que, conforme demonstrado, a empresa não possuiu empregados nos anos de 2009 a 2013, razão pela qual não esteve obrigada a pagar a contribuição sindical durante esse período.
E mais: o juiz posicionou-se no sentido de que, assim como as demais receitas sindicais, a contribuição legal só seria devida por aqueles que fossem filiados aos sindicatos, não se estendendo automática e involuntariamente para toda a categoria. Respeitosamente, o julgador ousou divergir da respeitabilíssima decisão do STF invocada pelo sindicato na petição inicial, esclarecendo que os fundamentos adotados naquela decisão baseiam-se exclusivamente em mera interpretação literal do inciso IV do artigo 8º da Constituição, conferindo validade à sua parte final e legitimando a permanência da anacrônica cobrança do vetusto “imposto sindical” de todos os integrantes das categorias profissionais e econômicas, independente de sua filiação. Ele lembrou que essa contribuição obrigatória é um dos resquícios da era corporativista do Direito do Trabalho brasileiro, em que o estado autoritário mantinha as entidades sindicais sob controle, interferindo em suas atividades. E citou doutrina nesse sentido, apontando que ela é uma das contradições antidemocráticas da Constituição de 1988, sendo fonte de corrupção, perpetuação de dirigentes sindicais na cúpula das agremiações, dirigentes esses completamente desvinculados das bases e desinteressados em estimular filiações, além da possibilidade de imposições decorrentes da atividade delegada de poder público.
O julgador ainda transcreveu trecho doutrinário revelador dos males da obrigatoriedade da contribuição, nos seguintes termos: “Permite a organização e manutenção de sindicatos sem a menor autenticidade, que não prestam e não têm interesse em prestar serviços aos associados, apenas na manutenção da direção por certas pessoas com o objetivo de obter estabilidade no emprego ou serem indicados juízes classistas na Justiça do Trabalho [desiderato impossível a partir da EC 24/99]. Não há necessidade de prestar serviços ou de conseguir associados para o sindicato, pois a contribuição sindical já custeia todas as despesas, ainda havendo sobras”.
Apesar de ressaltar que esses males não se verificam no sindicato, ele ponderou acerca da incoerência na manutenção dessas vicissitudes, principalmente porque essa compulsoriedade choca-se frontalmente com o direito de liberdade de associação (artigo 5º, XX, da CF/88) e a liberdade de associação sindical (artigo 8º, V, da CF/88). “Deveras, mesmo não tendo o Brasil ratificado a Convenção nº 87 da OIT, não há como se entender íntegra a mencionada liberdade quando alguém que a exerceu, não se filiando ou não se mantendo filiado ao sindicato de sua categoria (econômica ou profissional), é compelido a contribuir com a entidade. Não há direitos fundamentais em confronto no caso ora em análise, mas o simplista e injustificado estreitamento de liberdade constitucionalmente garantida. Aplicado o princípio da proporcionalidade, obviamente prevalecerá o direito fundamental sobre aquela imposição antidemocrática”, expressou-se o juiz.
Reforçando a insustentabilidade do entendimento jurisprudencial dominante sobre o tema, o magistrado ponderou que milita o princípio de máxima efetividade das normas consagradoras de direitos fundamentais, impondo leitura atualizada e interpretação sistemática acerca da obrigatoriedade da contribuição, considerado todo o entorno democrático presente na Constituição. E acrescentou que ao proceder desta forma, chega-se à conclusão de que, assim como as demais receitas sindicais, a contribuição legal só seria devida por aqueles que fossem filiados aos sindicatos, não se estendendo automática e involuntariamente para toda a categoria. O Juiz ainda esclareceu que o texto do art. 8º, IV da CF/88 não seria reduzido, porque as outras contribuições devidas ao sindicato continuariam podendo ser estabelecidas, independentemente da contribuição prevista em lei. “O antiquado regime disciplinado pelos arts. 578 a 610 da CLT receberia uma leitura conforme a Constituição, entendendo-se a participação de uma categoria não somente como o simples enquadramento sindical para destinação de receita, mas como integração ao corpo destinado à defesa dos interesses e à representação dela”, arrematou o magistrado.
Sob esses fundamentos, o juiz julgou improcedente o pedido de cobrança formulado pelo sindicato. Houve recurso dessa decisão, ainda pendente de julgamento.
( 0000113-40.2014.503.0038 )
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 05.10.2015
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