O grande legado dos Jogos Paralímpicos será mostrar aos brasileiros, de perto, que pessoas com deficiência podem ser altamente competitivas não só nos esportes, como também no mercado de trabalho. Essa é a avaliação da assessora especial do Departamento de Estado Americano para Direitos Internacionais da Pessoa com Deficiência, Judith Heumann, que veio acompanhar as competições e levantar a bandeira da inclusão dos profissionais com deficiência no mundo corporativo.
“A Paralimpíada é uma oportunidade emblemática para mostrar, no Brasil e ao redor do mundo, que as pessoas com deficiência podem fazer coisas como todas as outras. Os Jogos destacam os limites superados pelas pessoas com deficiência. Há muitos e muitos outros indivíduos, trabalhando ou tentando trabalhar, que fazem o mesmo”, comenta Judith.
No ano em que sedia a primeira Paralimpíada da América Latina, os brasileiros comemoram em 2016 os 25 anos da Lei de Cotas, a primeira a tratar do tema da inclusão social das pessoas com deficiência no país, sem que as obrigações legais tenham sido integralmente respeitadas pelas empresas.
Dados do Ministério do Trabalho mostram que, desde 1991, a lei gerou empregos para 380 mil profissionais ¬ menos da metade dos 827 mil postos de trabalho que estariam disponíveis, caso todas as companhias seguissem a lei, que obriga as empresas com mais de 100 funcionários a contratar uma cota mínima de pessoas com deficiência que varia de 2% a 5%.
Ativista pelos direitos civis para pessoas com deficiência desde os anos 70, Judith acredita que leis, por si só, não são suficientes para garantir o acesso ao mercado. O diferencial, segundo ela, está no convencimento dos empregadores.
“Pela minha experiência, o importante é que os empregadores enxerguem valor na contratação de pessoas com deficiência. É o líder sim [que vai ajudar a acabar com o preconceito]. Ele é responsável por endereçar o que particularmente a companhia precisa fazer, por fazer as recomendações, por reter a mão de obra e qualificar empregados”, opina Judith, que aos 18 meses de idade contraiu uma poliomielite que lhe deixou em uma cadeira de rodas.
Uma das fundadoras do Instituto Mundial de Deficiências, Judith colaborou com a redação da Lei dos Americanos com Deficiência (ADA, na sigla em inglês). Publicada em 1990, a legislação foi a primeira lei abrangente do mundo a garantir direitos iguais a pessoas com deficiência e tem como foco a proibição à discriminação em todas as áreas da vida pública e a promoção da acessibilidade
Ao contrário da legislação brasileira, a lei americana não prevê a fixação de cotas. Judith destaca, no entanto, que “países diferentes tem caminhos diferentes” de garantir a inclusão e que de um modo geral existe hoje, no mundo, um reconhecimento maior dos direitos da pessoa com deficiência.
A ativista, contudo, defendeu um debate maior sobre a diversidade da força de trabalho no mundo corporativo. “Precisamos discutir mais”, disse ela, para quem tão importante quanto gerar emprego é reter os profissionais.
Judith explica que a experiência internacional mostra que, de um modo geral, os custos associados à acessibilidade de um trabalhador com deficiência são pequenos. “O que as pessoas com deficiência estão discutindo no mundo é como gostaríamos de ter as mesmas oportunidades”, afirmou.
De acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as pessoas com deficiência recebem 11,4% a menos do que as sem. Ainda segundo dados do IBGE, do censo de 2010, 46,4% dos deficientes que possuem alguma ocupação recebem até um salário mínimo – para a população em geral esta parcela cai para 37,1%.
Fonte: Valor Econômico, por André Ramalho, 16.09.2016
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