sábado, 24 de setembro de 2016

Debate sobre terceirização joga pressão para os três poderes.

O embate sobre terceirização ainda aguarda análise no Supremo Tribunal Federal (STF) e regulamentação no Poder Legislativo. No STF, três processos envolvendo o tema serão julgados e podem alterar a estrutura da relação de trabalho. São eles: dois agravos em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida – ARE 791.932 de relatoria do ministro Teori Zavascki e RE 958.252 de relatoria do ministro Luiz Fux – e a ADPF 324, que tem como relator o ministro Luís Roberto Barroso.
No STF, a questão principal é a definição de parâmetros para a identificação do que representa a atividade-fim de um empreendimento, do ponto de vista da possibilidade de terceirização.
O RE e a ARE tiveram repercussão geral reconhecida pelo Plenário Virtual do STF, o que significa que a decisão sobre o tema será aplicada posteriormente pelas instâncias inferiores, em casos idênticos. O relator do RE 958.252, ministro Luiz Fux, ressaltou que existem milhares de contratos de terceirização de mão de obra nos quais subsistem dúvidas quanto a sua licitude, tornando necessária a discussão do tema.
Fux é relator do RE 958.252 e já liberou o caso para a pauta. O caso será analisado pelo plenário do STF e a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia é quem vai definir a data do julgamento. Nesse caso, os ministros vão discutir sobre a extensão da expressão “atividade-fim”, ao analisar o pedido de uma empresa de produção de celulose que pretende contratar outra empresa para atividades de florestamento e reflorestamento.
No legislativo, o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 30/15, que regulamenta contratos de trabalho terceirizados, foi aprovado pela Casa em 2015 e está parado no Senado sem avanço por resistência dos senadores, em especial do presidente da Casa Revisora, Renan Calheiros (PMDB-AL). Após uma rodada de conversas, há semanas, com o presidente, Michel Temer, Renan anunciou que o tema terceirização seria votado até o final de 2016, em moldes distintos do previsto pelo PLC 30.
No entanto, no mês passado, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, admitiu que o Governo Temer não tem interesse em aprovar o projeto de lei. Segundo ele, o texto que tramita no Senado servirá apenas de subsídio para a proposta do Governo Federal, que pelos planos do ministro será entregue ao Congresso Nacional até o final de 2016.
A discussão no judiciário começou após a edição da Súmula 331 do TST, que veda a terceirização de tarefas ligadas à atividade-fim das empresas. Isso é, as empresas devem estabelecer relação jurídica de emprego ao contratar qualquer atividade que envolva a atividade-fim do negócio.
Se de um lado a regra pode impedir contratações ilícitas com o objetivo de minorar encargos trabalhistas e previdenciários pelo lucro, do outro, também impede a especialização do negócio e o aumento de emprego em outras regiões do Brasil, menos desenvolvidas.
O Tribunal Superior do Trabalho pacificou o entendimento pela Súmula 331, inciso 111, que estabelece que a terceirização somente é legal quando se refere a atividade meio da empresa, desde que ausente a subordinação direta do prestador de serviços ao tomador destes mesmos serviços.
O objetivo ao proibir a “terceirização sem limites” é impedir que empresas usem a terceirização para fraudar a lei trabalhista e a precarização das condições de trabalho no Brasil, além disso, a fragmentação da produção dificulta a organização sindical para ajudar na luta por tais direitos.
A justificativa usada para impedir a terceirização em atividade-fim é que o emprego seria precarizado e o empregado deixaria de arcar com certos direitos trabalhistas estabelecido pelo Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), tais como remuneração por piso, FGTS, INSS, 13° salário, férias remuneradas, vale transporte, vale refeição e plano de saúde.
Do outro lado, os agentes econômicos apontam que a maioria dos terceirizados são registrados e possuem tais direitos. Além disso, afirmam que a relação de trabalho mudou e necessita de mais especialização. Neste ponto, eles afirmam que a profissionalização e maturidade do mercado de empresas fornecedoras de mão-de-obra já permite uma ampliação das hipóteses de terceirização. Eles questionam o motivo de não combater as contratações ilegais ao invés de impedir a terceirização.
Ainda, aqueles que defendem a terceirização citam o impacto econômico gerado com tal atividade econômica. Segundo fontes ouvidas pelos JOTA, a terceirização ajuda no crescimento econômico e social do país, gera renda, serviços e tributos, além de criar empregos em diferentes regiões do país.
Terceirização X locação de mão-de-obra
Especialistas no tema alertam para uma confusão constante: Terceirização não pode ser confundida com locação de mão-de-obra. Eles defendem ser preciso estabelecer critérios para proteger o trabalhador e não barrar uma crescente onda de especialização.
Em diferentes defesas da ilicitude da terceirização, a irregularidade da contratação de trabalhadores e a intermediação de mão-de-obra são citadas para argumentar a nulidade da intermediação, como por exemplo, a intermediação de mão-de-obra teve no intento de transferir a terceiros a atividade-fim da empresa.
Um caso clássico e muito citado por advogados de defesa é a especialização de serviços de tecnologia da informação. Eles questionam: É melhor contratar um técnico de informática para a empresa ou uma empresa especializada em TI que é especializada no serviço e atende outras empresas que já passaram pelos mesmos problemas?
“As empresas precisam se reinventar a cada dez ou vinte anos, e a organização da produção não cessa de assumir formas novas, na esteira do desenvolvimento da tecnologia da informação. Por isso, as relações entre o trabalho e a produção não podem ficar congeladas no tempo”, afirmou a Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse) ao pedir a sua inclusão no RE 958252 como amicus curiae.
Outro exemplo cita o modo escolhido pela Petrobras para perfurar poços de petróleo. Em vez de a estatal fazer a perfuração, contrata empresas especializadas que possuem o domínio de técnicas mais especializadas e que apresenta um menor custo, já que o ganho é em escala.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) junto com o Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho afirmaram, também no RE 958252, que vêm constatando a ocorrência de reiterada violação de direitos fundamentais dos trabalhadores “levada a efeito por grandes empresas multinacionais por meio da intensificação da exploração da força de trabalho e da adoção do processo de terceirização sem limites, impondo severa precarização das condições de trabalho e salário, com o claro propósito, por parte da empresa tomadora de serviços, de se desobrigar do cumprimento de normas primárias de proteção ao trabalho”.
Call-center
O ARE 791.932, de relatoria do ministro Teori Zavascki, analisa a situação específica de terceirização da atividade de call center. Após reconhecida a repercussão geral do caso, todos os processos que discutem a validade dessa atividades pelas concessionárias de telecomunicações estão sobrestadas.
O STF vai discutir a necessidade ou não da observância da regra de reserva de plenário para a recusa da aplicação do dispositivo da Lei das Telecomunicações – que autoriza a terceirização de “atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço”.
O ministro Teori acolheu pedido formulado pela Contax S/A, pela Associação Brasileira de Telesserviços (ABT) e pela Federação Brasileira de Telecomunicações.
O argumento da Contax, que interpôs o ARE, e as duas outras entidades, que ingressaram no processo como amici curiae, é que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) sobre a matéria, no sentido de considerar ilegais as terceirizações dos serviços de call center em empresas de telefonia, negou vigência ao artigo 94, inciso II, da Lei 9.472/1997 (Lei das Telecomunicaçoes) em desrespeito à cláusula constitucional de reserva de plenário e à Súmula Vinculante 10 do STF.
O problema começou quando empresas de telefonia passaram a contratar empresas especializadas em call center o que gerou ações na justiça do trabalho questionando se a terceirização era válida.
A defesa de empresas de call centers sustenta que a própria lei permite contratação de terceiros, inclusive para atividades essenciais a objeto da concessão. Segundo os advogados, ainda que fosse atividade-fim, a empresa poderia contratar terceirização, uma vez que o Tribunal Superior do Trabalhado não poderia se sobrepor à lei específica. O argumento é pela separação de poderes: TST não pode se intrometer no que determina lei específica sobre o tema.
A uniformização da jurisprudência trabalhista, segundo as entidades, atinge aproximadamente dez mil processos, obrigando as empresas especializadas nesse tipo de serviço “a desembolsar vultosas quantias a título de depósito recursal para prosseguirem resistindo à aplicação do entendimento”.
Ainda segundo os representantes do setor, tais circunstâncias têm causado “embaraços dramáticos” às empresas, que empregam cerca de 450 mil trabalhadores, com risco também para as concessionárias dos serviços de telefonia, que utilizam a terceirização em larga escala.
Em parecer, o advogado e ministro aposentado do STF, Ayres Britto, defendeu a terceirização em serviços de call center.
“Os serviços de Call Center se encaixam no conceito legal de ‘desenvolvimento’ das atividades inerentes, acessórias ou então complementares do serviço público de telecomunicação, mais aquelas destinadas à implementação de projetos associados. Todas a girar em torno de tal serviço estatal, objetivamente, assim como os respectivos prestadores gravitam, subjetivamente, no eixo de um determinado operador-concessionário de telefonia. Tudo para a mais facilitada incidência do princípio constitucional da eficiência administrativa em rema de prestação de serviço genuinamente público e visando, em ultima ratio, a elevação dos standards de bem-estar de cada usuário. Essa qualificada espécie de consumidor”, afirmou.

Fonte: JOTA, por Livia Scocuglia, 23.09.2016

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