segunda-feira, 8 de agosto de 2016

As novas tecnologias e a falta da inteligência moral.

Inteligência artificial, computação em nuvem, robótica avançada, veículos autônomos e impressão 3D são apenas algumas das tecnologias que a imprensa alerta que irão eliminar posições de trabalho ao redor do mundo. Um movimento único na recente história do capitalismo. Esse tema também domina os principais fóruns de líderes globais (como o World Economic Forum), já que os impactos para as sociedades, se elas não se prepararem, serão imensos.
Sobre o resultado dessa eliminação de postos de trabalho existem dois grupos: os futuristas ligados à tecnologia e os economistas, especializados na história da economia. Os primeiros são apocalípticos: posições serão extintas e cada vez existirão menos ofertas de atividades realizadas por humanos.
O segundo grupo fala que, ao longo da história, sempre existiram os apocalípticos e que as tecnologias criaram especializações que, após um período transitório, vão gerar mais empregos do que antes. Eu fico com o segundo grupo. Nos dois cenários, países emergentes como o Brasil se preocupam por diversos motivos, mas essencialmente pela falta de capital social e humano com habilidades para passar por esse período transitório sugerido.
Um outro aspecto está relacionado à capacidade moral para utilizarmos adequadamente essas tecnologias. Elas não são ruins ou boas, tudo depende do seu uso. A tecnologia nuclear, que foi essencial para se criar aparelhos de diagnósticos médicos que salvaram milhões de vidas, pode destruir milhões de outras.
Quase todas as novas tecnologias “disruptivas” que estão rapidamente encontrando aplicações ao nosso redor têm um grande potencial para criar benefícios, mas geram vulnerabilidades nunca antes vistas. A impressão 3D irá, em breve, possibilitar a criação de órgãos para transplante, resolvendo um problema histórico de filas de espera. Por outro lado, armas podem ser facilmente produzidas com a mesma tecnologia. Mídias sociais têm sido usadas tanto por pessoas que querem torna o mundo em melhor quanto por terroristas planejando ataques.
Paul Kordis, pesquisador e doutor pela Universidade do Colorado, resume a situação: a evolução tecnológica do ser humano progrediu em um ritmo exponencial incompatível com a evolução da nossa capacidade moral para lidar com ela.
Doug Lennick e Fred Kiel, entre vários outros pesquisadores, chamam essa capacidade de inteligência moral. Ela distingue como nossas ações impactam outras esferas ao nosso redor e guiam decisões que produzem o melhor resultado para o todo. O mais interessante nas pesquisas sobre inteligência moral é que elas sugerem que essa é uma habilidade adquirida e não um traço de personalidade – ou seja, ela pode ser desenvolvida.
Nesse momento do mundo, as empresas nunca tiveram tanto poder na transformação da nossa sociedade, pois são elas que estão desenvolvendo as aplicações para a maioria dessas tecnologias. Elas também deviam ser responsáveis por observar as práticas relacionadas ao desenvolvimento da inteligência moral de seus profissionais. A maioria das práticas correntes quer garantir compliance com as leis de onde operam, mas elas não cobrem todos os aspectos morais do impacto que podemos causar na sociedade.
Ao longo do tempo, todas essas tecnologias, como outras no passado, irão se tornar baratas e acessíveis. Obviamente, governos devem olhar para como desenvolvemos a inteligência moral para as futuras gerações. Isso não tira a responsabilidade das empresas, que influenciam muito o comportamento dos seus empregados além do ambiente de trabalho.
Para o nosso país, com todas as recentes evidências de corrupção tanto no ambiente empresarial como público, temos que refletir não apenas sobre como iremos garantir a transição para as novas habilidades exigidas, mas como iremos mudar a nossa referência moral.
(*) Claudio Garcia é vice-presidente executivo de estratégia e desenvolvimento corporativo da consultoria LHH, baseado em Nova York.

Fonte: Valor Econômico, por Claudio Garcia(*), 28.07.2016

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