O ano de 2017 se inicia com algumas promessas de retomada no crescimento econômico. Evidentemente, ainda no meio da tormenta da crise, sinais discretos parecem indicar que a terra firme, embora não visível, talvez esteja menos longe do que se imagina.
Para encurtar essa espera, o governo tem sugerido uma série de medidas. A “minirreforma trabalhista”, apresentada ao Congresso em pequenos projetos encaminhados no final de dezembro, é uma delas.
Apesar dos clamores diversos, ninguém nega que os temas para os quais se propõem mudanças são velhos conhecidos dos brasileiros, que há muito reclamam por evolução. Ora, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é documento de 1943, suficiente ao cenário da época. No entanto, mais de 70 anos após sua formulação, a falta de vagas no mercado de trabalho comprova, mais uma vez, que o modelo helicoidal do compêndio — que gira e gira em torno do eixo paternalista, não é adequado para atender às peculiaridades do contexto atual.
Pois bem, no que se refere ao setor tecnológico, com seu dinamismo e versatilidade, mudanças que possam fortalecer o crescimento das contratações e o equilíbrio da relação de trabalho, são obviamente muito bem-vindas. É notícia recorrente em relatórios sobre mão-de-obra, que o Brasil tem um déficit desconcertante de trabalhadores na área tecnológica [1]. De outro lado, sabe-se que boa parte da massa de empresas desenvolvedoras de tecnologia, pelo menos no que se refere às emergentes, é formada por micro e pequenos negócios, proeminentemente de startups, nascidas com baixos investimentos.
Por isso, o fomento ao ambiente de trabalho baseado em relacionamento equilibrado, lançando fora o tradicional pensamento maniqueísta envolvendo capital e trabalho, pode ser o impulso que o setor precisava, considerando que outros tipos de incentivo (financeiros, por exemplo), são praticamente inviáveis no momento.
De fato, as discussões sobre mudanças na jornada de trabalho, intervalo, ampliação do prazo de contratação de temporários, parcelamento de férias e trabalho remoto — como sinalizadas pelo governo, parecem apropriadas ao mundo de TI. O trabalho em home office (teletrabalho), que é um modelo pontuado recentemente pela legislação, poderia ser mais adotado se o sistema evoluísse. Observa-se também, que temas como monitoramento eletrônico, fornecimento de equipamentos pelo empregador versus jornada de sobreaviso e BYOD (Bring Your Onw Device), tratados pela jurisprudência, poderiam ser objetivamente esclarecidos (trazendo mais segurança jurídica) se a legislação abrisse espaço para isso.
Neste sentido, a proposta governamental de prevalência do negociado sobre o legislado, garantindo que negociações entre as categorias, lideradas por especialistas nas idiossincrasias do setor tenham o poder de estabelecer regras customizadas, parece atender às realidades do mercado. Resta-nos aguardar, entretanto, o imprevisível posicionamento conclusivo do Congresso a respeito das alterações.
Mas, sintetizando os debates, parece mesmo que a escolha aqui não é exatamente sobre suprimir ou criar direitos, mas sim sobre qual é o Brasil que queremos para os próximos anos: aquele constituído predominantemente de trabalhadores dependentes, que vez ou outra sobrevivem de benesses, bolsas e proventos governamentais; ou o Brasil de empreendedores e trabalhadores — igualmente valorizados, que podem produzir em ambiente justo e favorável a novos negócios.
É verdade — o enjoo da navegação turbulenta da crise permanece. Mas a pergunta crucial que se faz é: quando tudo isso passar, em qual tipo de nação vamos desembarcar [2]?
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[1] http://veja.abril.com.br/economia/desemprego-esta-alto-mas-ha-setores-em-que-falta-mao-de-obra/
[2] A mesma de 1943?
(*) Renato Opice Blum é mestre pela Florida Christian University, advogado e economista; Professor coordenador do curso de Direito Digital do Insper.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, por Renato Opice Blum (*), 15.02.2017
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