A conhecida frase “Não sabendo que era impossível, foi lá e fez”, frequentemente evocada como mote de autoajuda, certamente não se aplica quando o assunto são as metas corporativas. “Ao perceber que as metas são inatingíveis, as pessoas se desmobilizam. Esse é um comportamento natural do ser humano”, diz a consultora Magui Castro, sócia da Caldwell Partners.
Esse tema se apresentou especialmente delicado em um ano atingido em cheio pela crise econômica e política. Nesse cenário, a tênue fronteira entre metas desafiadoras e metas impossíveis passou a ser rompida com frequência por empresas de todos os setores e portes, por conta de fatores imprevisíveis que alteraram o rumo das coisas em relação ao início do ano.
A discussão volta a se tornar relevante neste momento do ano, em que as metas para 2016 estão sendo traçadas e servirão como guia para vários outros processos das empresas, incluindo a participação nos resultados e a concessão de bônus.
A Cemar, Companhia Energética do Maranhão, de administração privada, viu ao longo do ano diversos fatores que influenciam o desempenho da empresa sendo diretamente impactados pela crise. As metas de receita e de perda na distribuição, por exemplo, foram afetadas pelas dificuldades financeiras dos consumidores – o que leva ao aumento da inadimplência e do número de ligações ilegais, exigindo mais investimentos para combater os chamados “gatos”.
“Não é fácil administrar essa imprevisibilidade diante da equipe. As pessoas querem ter referências sólidas dos objetivos que precisarão alcançar e não lidam bem com mudanças, por mais que a gente tente ser transparente ao justificá-las”, diz a diretora de gente e gestão, Carla Medrado. Para não dar a sensação de que está mudando as regras no meio do jogo, a empresa cogita até adiar a definição das metas para 2016, tradicionalmente feita em fevereiro, à espera de maior clareza sobre as perspectivas do ano novo.
Na Sol Informática, rede paraense de lojas de equipamentos e suprimentos de tecnologia da informação, lidar com as metas não tem sido fácil – em 2015, as vendas caíram quase 30% em relação ao ano passado. Entre os inevitáveis efeitos, houve corte de benefícios e redução do quadro de funcionários.
Na tentativa de elevar o ânimo da equipe e talvez recuperar parte do prejuízo, a empresa decidiu retomar as metas originais para os dois últimos meses do ano, por conta do Natal. Como as expectativas de novembro não se comprovaram, no entanto, foi preciso voltar atrás e admitir que o cenário continua ruim. “As vendas de fim de ano não serão boas, e não adianta a gente se iludir ou tentar iludir as pessoas que trabalham aqui. Acreditamos que todos farão o máximo que podem nas semanas que restam este ano, mas certamente não é hora de estipular metas fora da realidade”, diz a gerente de recursos humanos da Sol, Kelly Silveira.
As dificuldades em relação à definição das metas são intensamente vividas também pelas subsidiárias brasileiras de multinacionais. Em muitos casos, os números são estabelecidos pela matriz sem levar em conta as especificidades locais. “Nem sempre os CEOs brasileiros têm firmeza suficiente para dizer que as metas que estão recebendo são impossíveis diante do cenário atual. Muitos preferem engolir algo empurrado pela matriz e tentar convencer a equipe local de que é possível chegar lá, quando nem mesmo eles acreditam”, afirma Magui Castro.
Ela considera que a estratégia para definir metas mais realistas e conquistar a confiança da matriz sobre a pertinência do raciocínio é a parceria entre o CEO e o diretor financeiro. Eles precisam desenvolver e apresentar um estudo detalhado sobre a indústria e a realidade econômica do país. “É preciso demonstrar que a previsão apresentada não é um chute, e sim o resultado de uma análise criteriosa envolvendo fatores diversos”, aconselha.
Fonte: Valor Econômico, por Maurício Oliveira, 09.12.2015
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