terça-feira, 22 de dezembro de 2015

A Europa e a crise do desemprego.

A criação de empregos é um dos desafios mais importantes com que a sociedade se defronta. Isso é verdadeiro tanto do ponto de vista social quanto do econômico, principalmente em meio a uma crise econômica tão persistente quanto a que atingiu o mundo na primeira década do século XXI. Uma das consequências mais dramáticas dessa crise foi o aumento do desemprego. Nem todos os países foram afetados da mesma maneira por essa tendência; em vez disso, o problema dependeu, em grande parte, das medidas adotadas para combatê-lo. Ninguém discute a necessidade de gerar postos de trabalho e de reduzir as taxas de desemprego aos níveis mais baixos possíveis. O problema está nas medidas empregadas para alcançar essa meta.
Certamente é um desafio encontrar as medidas corretas para estimular o emprego, embora devam ser feitos esforços para adotar passos que percorram os caminhos que nos levarão a elas. A Europa, com sua diversidade de dirigentes e de nômades econômicos, fornece uma multiplicidade de exemplos de medidas tomadas para ajudar a resolver o dilema do desemprego. Algumas deixaram a desejar e outras conseguiram mudar o sentido descendente de um panorama trabalhista frágil. Sobre estas últimas, por mais diverso que o “Estado de bem-estar social” possa ser dos modelos políticos de outros continentes, sempre há algo “utilizável” a oferecer.
A construção de ponte entre o que os jovens podem oferecer e o que o mercado de trabalho necessita é fundamental para o combate ao desemprego. A sociedade democrática tem de ter responsabilidade para tratar todos os cidadãos de acordo com as suas possibilidades
Os países europeus que melhor administraram a crise económica e o desemprego começaram com um amplo consenso social e político que lhes permitiu criar medidas específicas, às vezes muito rigorosas, para enfrentar o verdadeiro problema. A Alemanha lançou mão da “Comissão Hartz” (2003-2005) para estimular a criação de empregos, o “Programa Wassenaar” da Holanda (1982) permitiu que funcionários mantivessem seus empregos por meio da aceitação de cortes salariais em troca da redução das horas de trabalho, com a possibilidade de se candidatar a um aumento ou diminuição da duração da jornada de trabalho (2000), e o acordo “Abfertigung neu” da Áustria (2003) introduziu uma mudança importante no sistema obrigatório de pagamentos de verbas rescisórias e na facilitação a um futuro complemento às aposentadorias.
Um consenso social promovido pelos governos, inexistente em Portugal, Espanha, Itália e Grécia, teria pleno apoio dos empregadores e sindicatos e seria compreensível junto a adversários políticos. Os fatores indispensáveis para enfrentar a situação vêm sendo a ampliação das perspectivas, do entendimento e do esforço, principalmente entre os líderes empresariais, os agentes fundamentais da criação de empregos.
A ausência de criação de empregos para a juventude é um dos outros males decorrentes da atual fragilidade da saúde econômica dos países. A Alemanha geriu seus sintomas, e continua sendo hoje a única nação que conseguiu diminuir o desemprego entre os jovens desde o início da crise, ao baixá-lo para menos de 8%.
Não há dúvida de que os cidadãos recém-formados das nossas sociedades querem se integrar à população economicamente ativa. Mas foi por negligência de instrução, de profissionalismo, de iniciativa ao longo desses anos, provocada por outras tensões econômicas, que os recém-formados ou os que obtiveram seu grau recentemente estão hoje sem trabalho. A Alemanha, sem dúvida, realizou a façanha de diminuir seu índice de desemprego entre os jovens graças a uma cultura de treinamento consagrada pelo tempo, que fez com que empresas se envolvessem no processo de recrutamento de jovens.
O emprego de meio período é outra solução eficiente na hora de aumentar as oportunidades de emprego. A Holanda é um exemplo claro de um país que adotou medidas para aumentar as oportunidades de empregos de meio período, com 50% dos contratos sendo de período parcial, bem acima da média europeia de pouco mais de 20%. Os holandeses promoveram esse tipo de contrato no início da década de 1980, como uma forma de equilibrar trabalho e família ou lazer, numa época em que o percentual de mulheres que ingressava no mercado de trabalho aumentava rapidamente; na década de 1990, eles encararam esses contratos como uma maneira eficiente de combater a crise e promover o emprego; e na década de 2000, concederam a esses contratos todos os mesmos direitos dos contratos de período integral. A possibilidade de uma modificação de um contrato é às vezes relegada, na pressa de tentar criar contratos a partir do nada.
A flexibilidade dentro de uma empresa, embora possa parecer supérflua à primeira vista com relação à criação de empregos, desempenhou, na verdade, papel fundamental na esfera da produtividade, na superação dos momentos mais difíceis da crise e na capacidade de encontrar respostas para evitar desativações de companhias e dispensas em massa. Um dos ônus reais foi a rigidez imposta por um sindicalismo anacrônico e incapaz de se adaptar aos tempos em que vivemos, principalmente nos países do Sul da Europa.
Os pagamentos das verbas rescisórias deram lugar à proteção social dos desempregados, como se vê na Dinamarca e na Áustria, e a investida decisiva em favor de políticas ativas de emprego, como a realizada pela Alemanha, se concentrou em adaptar o ensino dos desempregados e dos jovens, de modo a atender às necessidades das empresas; ou, em outras palavras, de modo a fazer com que a oferta correspondesse à demanda. A construção dessa ponte entre o que os jovens podem potencialmente oferecer e o que o mercado de trabalho necessita é fundamental para que um país combata o desemprego.
Uma sociedade democrática tem de ter um senso de responsabilidade e sensibilidade para tratar todos os cidadãos de acordo com as suas possibilidades e com seu papel social, dando-lhes uma ajuda e auxiliando-os a ilustrar por meio de seu comportamento os valores que compõem as nossas culturas. A solidariedade para consigo mesmo deveria dar lugar à sociedade para com os outros, principalmente com aqueles que dela mais precisam. Os tidos por alguns como “o coração e a alma” da sociedade são postos à prova nos tempos difíceis, quando o que realmente importa não são palavras, mas atos.
Fonte: Valor Econômico, por Sandalio Gomez, 07.12.2015

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